João do Pife
Para João Alfredo Marques dos Santos, o pífano é a alegria transformada de forma artesanal. Com quase 60 anos de prática, ele pega a tora de taboca, serra, marca a escala, fura, toca. A partir daí, em qualquer canto que chega bota todo pra mundo dançar. “Alegria se faz assim, com um pedaço de madeira”, diz o músico e artesão, conhecido como João do Pife.
O que ele chama de dom foi herdado do pai e mestre Alfredo, quando moravam no pé da serra, em Riacho das Almas, a 18 km de Caruaru. No meio de bodes, ovelhas, dentro dos matos, na roça, plantando milho e feijão, quando a chuva dava.
Nos fins de semana, João saía pelos sítios tocando nas tradicionais novenas e romarias com os ternos de zabumba, como eram chamadas as bandas de pífano antigamente. E assim, ao lado do pai e de Severino, um dos seus sete irmãos, ele foi tomando gosto. E tocava na novena de Seu Mané, e tocava na novena de Seu Pedro.
O tempo foi indo e indo e o pai de João adoeceu, ficou cansado e entregou o terno de zabumba aos dois irmãos: “Ói Severino e João, vocês são pifeiros muito bons e nós gostamos. Eu tou cansado, mas não deixem acabar o terno de zabumba, que é uma tradição nossa. ”
Seu Alfredo ainda ficou muito tempo vivo, sempre acompanhando e admirando o trabalho dos dois filhos. Ainda mais quando um deles resolveu ganhar a cidade e saiu de um Riacho das Almas ainda sem energia elétrica.
“Se a gente ficar aqui no pé da serra, na roça, vai chegar um tempo que as novenas vão se acabar. Tenho que ir pra um lugar maior, pra ver se a gente fica mais conhecido”, pensou João do Pife. Enquanto ele escolheu ir, o compadre e irmão Severino quis ficar. “Eu chego lá e invento qualquer coisa”, disse um. “Eu não saio daqui pra Caruaru sem saber fazer nada lá”, disse o outro, emendando: “Mas, precisou de mim, mande recado que eu vou.”
Aí, lá se foi João. Novo. Matuto. Corajoso.
Alugou uma casinha no Salgado – bairro onde mora há 40 anos – e ficou pensando em como levar a vida. Começou a fazer pífanos para vender na feira de Caruaru, numa barraquinha ao lado do Mestre Vitalino. Chegava às 9h e quando dava 13h, estava cheio de turista do Recife, de São Paulo, da Europa. Tocava e o povo se surpreendia. Aí João conseguia o dinheiro da feira e juntava o do aluguel.
Começou a correr o boato de que o matuto estava muito bem. “João tomou conta da feira”. “João é desenrolado mesmo”. “É parada”. Nesse tempo, foi chamado para tocar no Recife, ficou numa ansiedade tão grande… Depois disso, foi ao Rio de Janeiro, a Salvador, a São Paulo, a Brasília, sempre levando junto o irmão.
Um dia bateram na porta:
– João do Pife?
–Tá falando com ele.
– Sou mandado aqui da Fundação Joaquim Nabuco para registrar você para ir pra Portugal.
– Poxa. E onde é isso?
Na outra semana, ligaram pro telefone da vizinha pra confirmar. João nem dormiu na noite anterior aos 14 dias que passou em Portugal com a banda. “Uma surpresa para matuto que nem a gente. Eu fui conhecer só Caruaru e cheguei bem mais longe”, lembra.
Aos 68, João só pede a Deus mais um bocadinho de vida pra desfrutar mais ainda o Brasil, a Europa, os amigos, o pífano e gravar seu segundo CD. E dentro da sua oficina continua a planejar maneiras de fazer vivo o som agudo do pife, que carrega no nome. Mesmo com as novenas se acabando, João adapta seu repertório e toca no Carnaval, no São João… Dos oito filhos que teve, quatro são músicos e participaram do primeiro CD.
Uma das histórias que João conta é que quando Jesus andava pelo mundo, Nossa Senhora resolveu fazer uma procissão. Mas, para não ficar só na reza, decidiu que tinha que ter uma musiquinha acompanhando. “Um cabra chegou com uma sanfona, um triângulo e uma zabumba e ela não aceitou. Depois, chegou outro numa viola, para acompanhar, e ela disse ‘Não’. Chegou uma coisa e outra, sempre recusadas. Até que chegou a banda de pífano e ela disse: ‘É essa mesmo. Com isso aí é que a gente vai fazer a procissão’”.
Se Nossa Senhora ouvisse o sopro de João, ela ia ter certeza de que não tinha errado. É novena, xaxado, xote, valsa. Tudo guardado na cabeça e tocado com maestria. Quando termina parece que o sorriso que ele dá é nota musical.
“Se a gente ficar aqui no pé da serra, na roça, vai chegar um tempo que as novenas vão se acabar. Tenho que ir pra um lugar maior, pra ver se a gente fica mais conhecido”, pensou João do Pife. Enquanto ele escolheu ir, o compadre e irmão Severino quis ficar. “Eu chego lá e invento qualquer coisa”, disse um. “Eu não saio daqui pra Caruaru sem saber fazer nada lá”, disse o outro, emendando: “Mas, precisou de mim, mande recado que eu vou.”
Aí, lá se foi João. Novo. Matuto. Corajoso.
Alugou uma casinha no Salgado – bairro onde mora há 40 anos – e ficou pensando em como levar a vida. Começou a fazer pífanos para vender na feira de Caruaru, numa barraquinha ao lado do Mestre Vitalino. Chegava às 9h e quando dava 13h, estava cheio de turista do Recife, de São Paulo, da Europa. Tocava e o povo se surpreendia. Aí João conseguia o dinheiro da feira e juntava o do aluguel.
Começou a correr o boato de que o matuto estava muito bem. “João tomou conta da feira”. “João é desenrolado mesmo”. “É parada”. Nesse tempo, foi chamado para tocar no Recife, ficou numa ansiedade tão grande… Depois disso, foi ao Rio de Janeiro, a Salvador, a São Paulo, a Brasília, sempre levando junto o irmão.
Um dia bateram na porta:
– João do Pife?
–Tá falando com ele.
– Sou mandado aqui da Fundação Joaquim Nabuco para registrar você para ir pra Portugal.
– Poxa. E onde é isso?
Na outra semana, ligaram pro telefone da vizinha pra confirmar. João nem dormiu na noite anterior aos 14 dias que passou em Portugal com a banda. “Uma surpresa para matuto que nem a gente. Eu fui conhecer só Caruaru e cheguei bem mais longe”, lembra.
Aos 68, João só pede a Deus mais um bocadinho de vida pra desfrutar mais ainda o Brasil, a Europa, os amigos, o pífano e gravar seu segundo CD. E dentro da sua oficina continua a planejar maneiras de fazer vivo o som agudo do pife, que carrega no nome. Mesmo com as novenas se acabando, João adapta seu repertório e toca no Carnaval, no São João… Dos oito filhos que teve, quatro são músicos e participaram do primeiro CD.
Uma das histórias que João conta é que quando Jesus andava pelo mundo, Nossa Senhora resolveu fazer uma procissão. Mas, para não ficar só na reza, decidiu que tinha que ter uma musiquinha acompanhando. “Um cabra chegou com uma sanfona, um triângulo e uma zabumba e ela não aceitou. Depois, chegou outro numa viola, para acompanhar, e ela disse ‘Não’. Chegou uma coisa e outra, sempre recusadas. Até que chegou a banda de pífano e ela disse: ‘É essa mesmo. Com isso aí é que a gente vai fazer a procissão’”.
Se Nossa Senhora ouvisse o sopro de João, ela ia ter certeza de que não tinha errado. É novena, xaxado, xote, valsa. Tudo guardado na cabeça e tocado com maestria. Quando termina parece que o sorriso que ele dá é nota musical.
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