sábado, 30 de março de 2019
Consuelo de Paula
é cantora, compositora, poeta, diretora artística e produtora musical de seus próprios trabalhos. Samba, Seresta e Baião (1998), lançado nos Teatros do SESC Pompéia e Ipiranga (SP); Tambor e Flor (2002), lançado no Theatro Ateneo da Argentina e no Teatro Paiol de Curitiba; Dança das Rosas (2004), lançado no Theatro Municipal de São Paulo e no Teatro Gran Rex de Buenos Aires. Em junho de 2008 foi produzida no Japão a coletânea desses três álbuns, batizada de Patchworck, resultado de sua obra ter obtido destaque na capa do Guia Japonês Brasilian Music (Massato Asso), que selecionou os 500 melhores CDs da música brasileira de todos os tempos.
Em 2011 Consuelo lançou seu primeiro livro, A Poesia dos Descuidos (Consuelo de Paula e Lúcia Arrais Morales), premiado pela Secretaria de Cultura do Estado de SP, e também seu primeiro DVD Negra, gravado ao vivo no Teatro Polytheama de Jundiaí. Negra revela novas nuances na trajetória musical de Consuelo de Paula; expressa a pulsação, a alegria e a sensualidade sugeridas pela cor vermelha. Através da voz, Consuelo cria um espetáculo que sugere uma seqüência de quadros de um filme único e envolvente e o resultado é um trabalho sensorial, caloroso, que guarda a delicadeza já presente nas obras anteriores.
Em 2011 Consuelo lançou seu primeiro livro, A Poesia dos Descuidos (Consuelo de Paula e Lúcia Arrais Morales), premiado pela Secretaria de Cultura do Estado de SP, e também seu primeiro DVD Negra, gravado ao vivo no Teatro Polytheama de Jundiaí. Negra revela novas nuances na trajetória musical de Consuelo de Paula; expressa a pulsação, a alegria e a sensualidade sugeridas pela cor vermelha. Através da voz, Consuelo cria um espetáculo que sugere uma seqüência de quadros de um filme único e envolvente e o resultado é um trabalho sensorial, caloroso, que guarda a delicadeza já presente nas obras anteriores.
Em outubro de 2012 a artista lança o CD CASA acompanhada pela Orquestra À Base de Corda de Curitiba com canções dela e de Rubens Nogueira; convidou arranjadores como Dante Ozzetti, Chico Saraiva, Weber Lopes, Luiz Ribeiro e o próprio maestro da orquestra, João Egashira. Casa é mais uma obra primorosa de Consuelo que assina a concepção, a direção e a produção.
Seus três CDs, considerados sucesso e referência pela crítica, estão articulados a partir de uma unidade conceitual a nos revelar uma trilogia. Todos foram reeditados pela Tratore, com distribuição para todo o Brasil e para o exterior. O DVD Negra, o Livro A Poesia dos Descuidos e o CD CASA são distribuídos pela Tratore e também estão disponíveis na loja virtual da própria artista.
Ao longo de sua trajetória artística tem participado de diversos projetos culturais e de programas conceituados como o Ensaio (direção Fernando Faro) na TV Cultura de São Paulo, Talentos (Giovani Souza), na TV Câmara de Brasília; A Voz Popular (Luís Antônio Giron) na Rádio Cultura de São Paulo, Letra e Música (Pascoale Cipro Neto); Contacto Brasil, na Rádio Jazz, Venezuela, entre outros. Realiza shows em espaços importantes como o Teatro Gran Rex de Buenos Aires (Noite Brasileira, com Consuelo de Paula e Naná Vasconcelos); Theatro Municipal de São Paulo; Teatro do Centro Cultural Banco do Brasil (Consuelo de Paula, Rolando Boldrin, Chico Pinheiro e Heródoto Barbeiro); CCBB de Brasília (projeto Nossa Língua, Nossa Música, ao lado de artistas da Ilha da Madeira e do Timor Leste, entre outros); Teatro do Itaú Cultural, São Paulo; Teatro do Paiol, Curitiba (Projeto Orquestra à Base de Cordas Convida); Clube do Banco do Nordeste, Fortaleza; Centro Cultural Santander, Porto Alegre; Centro Cultural da Caixa Federal de Curitiba (Projeto Solo Música); Teatro da FUNARTE, Rio de Janeiro; Teatro Abílio Barreto, Belo Horizonte; principais teatros dos SESCs no Estado de São Paulo. Percorreu diversas cidades em diferentes estados brasileiros através do Projeto Pixinguinha da FUNARTE.
Consuelo de Paula é uma das poucas artistas de sua geração que possui, de fato, uma obra auto-referente na forma e no conteúdo. Possui forte presença de palco e carisma, revelando-se primorosa intérprete de sua própria obra e de outros autores. Sua expressão artística é marcada por profunda coerência, sensibilidade e dedicação aos elementos da cultura musical brasileira, com tudo o que ela tem de particular e de universal, de modo a sempre nos colocar diante de algo novo, inusitado e surpreendente, sempre a nos mostrar onde mora o Brasil. Com uma trajetória singular, Consuelo se apresenta como herdeira da arte musical brasileira e mantém compromisso com a contemporaneidade, compromisso esse expresso na maneira inovadora de compor, harmonizar e interpretar. Refinamento erudito, elegância popular e boas idéias são elementos constantes em sua obra, o que lhe tem assegurado profundo respeito, admiração e reconhecimento do público e da crítica especializada.
Outros trabalhos registrados:
Consuelo foi convidada a participar de outros importantes CDs: canta ao lado de Rolando Boldrin no CD Senhor Brasil; abre o CD Prata da Casa, do SESC, com sua canção Dança para um poema; interpreta a canção Lua Branca (de Chiquinha Gonzaga) em Divas do Brasil, disco de prata em Portugal, que reúne as melhores cantoras brasileiras: Elis Regina, Maria Bethânia, Céline Imbert, Bebel Gilberto, Astrud Gilberto e Zizi Possi, entre outras; comparece em duas faixas na coletânea Cachaça Fina (Spirit of Brazil), lançada no exterior: Samba, seresta e baião, de sua autoria, e Moro na Roça, samba que já foi interpretado por Clementina de Jesus.
Assinou o roteiro do CD Velho Chico, uma viagem musical, do cantor e compositor Elson Fernandes, no qual interpreta a canção O Ciúme, de Caetano Veloso, considerada a gravação definitiva pelo crítico Mauro Dias, no jornal O Estado de São Paulo.
Sua canção Sete Trovas foi gravada por Maria Bethânia no premiado CD Encanteria e no DVD Amor, Festa e Devoção.
ZEZA DO COCO
Maria José da Silva,esta é a graça de Zeza do Coco, que nasceu no Leste do estado de Alagoas,na Zona da Mata,na cidade de Cajueiro, durante uma novena do mês de Maio de 1955,quando marcava dia 10, no calendário Gregoriano.
Mestra de Coco de Roda começou a dançar aos cinco anos de idade quando acompanhava seus pais nas tapagens das casas de taipas, nos sítios e fazendas da Zona da Mata Alagoana. A dança do coco de roda esteve sempre presente na sua vida,nora da renomada coquista Mestra Hilda, no ano de 1975 participou ativamente da fundação do grupo de pagode " Comigo Ninguém Pode " da mestra Hilda com quem dividiu participações e apresentações em festivais culturais nos estados nordestino de Alagoas,Sergipe,Pernambuco,Paraíba e Ceará.No ano de 2015,teve o reconhecimento do seu compromisso e dedicação como mestra e brincante do folguedo popular do estado de Alagoas,recebendo naquele ano o merecido titulo de Patrimônio Vivo da Cultura,através da Secretaria de Cultura do estado.
sexta-feira, 29 de março de 2019
Tradução e tradição de crítica de Toni Rumbau ao Mamulengo Presepada
O MAMULENGO DE CHICO SIMOES.
Dentro de sua intenção de apresentar diferentes mestres titereiros solistas do mundo, LA PUNTUAL apresentou estes dias o “mamulengueiro” Chico Simões com o show “O romance do Vaqueiro Benedito”.
Explicando em primeiro lugar, que “Mamulengo” é o nome dado para a tradição do teatro de bonecos populares do Brasil, que ainda é mantida viva por marionetistas como Chico Simões, embora haja cada vez menos mestres dedicados a esta arte tradicional.Eu já havia visto Mamulengos em uma viagem a um festival no Brasil há muitos anos (em Nova Friburgo), e a verdade é que eu não me lembrava muito do show. Daí o meu interesse em ver novamente um mestre brasileiro, anunciado como um das melhores.
Devo dizer que ver o Mamulengo Presepada (“fanfarronice” em Português), nome do grupo de Chico Simões foi uma alegria absoluta, um prazer e um reencontro com a melhor tradição da veia titeriteira da vida, que a tradição cujas ações ordinárias nascem nos teatro-personagens (porque ambos são inseparáveis) Pulcinella, Punch, Polichinelle, Aragosi (no Egito), Cristobita, Don Roberto, Petrushka, Kasperl, Mobarak (no Irã) e muitos outros que existem por geografias pelo mundo. A verdade é que foi uma surpresa muito agradável, porque ele me lembrou do Mamulengo mais “falante” e menos “técnico” em suas evoluções cênicas.
Chico Simões é realmente um “mestre” de verdade, a uma altura comparável à dos Pulcinellas Bruno Leone e gato Salvatore, Don Roberto de Joan Paulo Cardoso, ou os melhores professores de Punch and Judy que eu conheci muito da minha vida marionetista. E, se falei desses nomes é porque a teoria de que todos esses teatros realmente surgem a partir do mesmo tronco comum vital, sustenta a tese vendo Chico Simões com seu teatro, movendo seus bonecos e dando-lhes vida com a voz e com a música de uma gaita que toca enquanto manipula. A vitalidade da arte é titeriteira mais refinada neste Mamulengo rápido e preciso, com gestos precisos, cenas magistralmente coreografadas com desempenho e pontuadas pelos pés, mãos ou os mesmos bonecos, com golpes harmônicos e percussivos.
Mas onde a tarefa é levantada ainda mais para os altos picos de boa arte titeriteira é nas alterações de voz e a definição dos personagens, com excelente capacidade rítmica do improviso e da “tagarelice musical” que transforma a função em um hilaridade constante de riso. Chico Simoes faz com que seus personagens conversem com os espectadores por meio de mal entendidos e constantes jogos de palavras, com os quais ele rapidamente consegue o público em seu bolso.
O argumento é muito simples e essa simplicidade é o lugar onde surge a vida feroz dos personagens, alguns equipados com um catarro jocoso e irônico, outros presos pelo puro nervo vital onde a síntese teatral mais extrema é destilada. O Vaqueiro Benedito é deste último, com seu touro clássico que permite jogos infinitos e rotinas coreográficas (com peido incluído). Muito perto de acordo com a “tourada” de Don Roberto, e ao mesmo tempo muito distante, livre da compulsão “tauromaquica” tão tipicamente ibérica. Você pode ver que Chico vem de um grande país onde as tradições de vários continentes convergem, e onde o “relaxamento” de uma cultura de “grande encorajamento” é percebida.
A história de amor de Benedito com Margarida vem do fundo, da antiga e sintética arte de amar da tradição titeriteira: tudo acontece a uma velocidade vertiginosa, e a conseqüência desses amores é o bebê inevitável, que mija, mija os pais e mija o público. Um tema relacionado a todas as tradições do gênero (lembre-se do bebê Punch, Pulcinella, Karakoz …). (o Mamulengo) Enfatiza o personagem do Capitão João Redondo, pai de Margarida, o “mau” da história, mais preocupado com o touro do que a filha, sua presença chama a Cobra que o público de pronto confundiu com um crocodilo, ocupando o mesmo papel que tem no Punch and Judy, bem como dragões e outros animais boca grande que abre e fecha engolindo tudo que vem pela frente. Claro, a Cobra come o Capitão João Redondo, e será finalmente o Vaqueiro Benedito, seu genro, que vai tirá-lo de problemas. Outro personagem interessante é o Bumba-Meu-Boi Estrela, bem como o velho negro cujo pescoço se estende por dois metros, personagem de origem africana, como nos disse o marionetista no final da apresentação. Igualmente impressionante foi o aparecimento de uma Morte representada pela cabeça do esqueleto de uma cabra, personagem popular brasileiro amplamente utilizado tanto em bonecos quanto em seu grande formato nos desfiles de certas festividades locais. Também foi cumprida aqui uma lei de quase todos os teatros de fantoches populares, para introduzir o caráter da Morte em suas histórias (embora aqui adquira seu próprio nome e pertença a um folclore de concreto). Outro personagem interessante é o Bumba-Meu-Boi Estrela, bem como o velho negro cujo pescoço se estende por dois metros, personagem de origem africana, como nos disse o marionetista no final da apresentação.
Ah, e no caso de um marionetista brasileiro, a dança não podia ser desperdiçada: quase todos os personagens dançam e cantam uma vez ou outra, com graça primorosa.O teatro de Chico Simões é elegante e ao mesmo tempo popular, com elementos de bambu que lhe dão um ar alegre e arquetípico. Sua simplicidade é eficaz, não poupa nem falta nada, como deveria ser. No final, pude ver dentro do teatro e o que mais gostei foi a mala, cheia de fotografias e lembranças de suas viagens, onde o marionetista mantinha seus fantoches um a um.
É um prazer e um verdadeiro luxo poder assistir a uma performance de tão alto nível em Barcelona, por um mestre de todas as idades, ainda jovem, pela sua sorte, pelo público e pela arte titeriteira.
Dentro de sua intenção de apresentar diferentes mestres titereiros solistas do mundo, LA PUNTUAL apresentou estes dias o “mamulengueiro” Chico Simões com o show “O romance do Vaqueiro Benedito”.
Explicando em primeiro lugar, que “Mamulengo” é o nome dado para a tradição do teatro de bonecos populares do Brasil, que ainda é mantida viva por marionetistas como Chico Simões, embora haja cada vez menos mestres dedicados a esta arte tradicional.Eu já havia visto Mamulengos em uma viagem a um festival no Brasil há muitos anos (em Nova Friburgo), e a verdade é que eu não me lembrava muito do show. Daí o meu interesse em ver novamente um mestre brasileiro, anunciado como um das melhores.
Devo dizer que ver o Mamulengo Presepada (“fanfarronice” em Português), nome do grupo de Chico Simões foi uma alegria absoluta, um prazer e um reencontro com a melhor tradição da veia titeriteira da vida, que a tradição cujas ações ordinárias nascem nos teatro-personagens (porque ambos são inseparáveis) Pulcinella, Punch, Polichinelle, Aragosi (no Egito), Cristobita, Don Roberto, Petrushka, Kasperl, Mobarak (no Irã) e muitos outros que existem por geografias pelo mundo. A verdade é que foi uma surpresa muito agradável, porque ele me lembrou do Mamulengo mais “falante” e menos “técnico” em suas evoluções cênicas.
Chico Simões é realmente um “mestre” de verdade, a uma altura comparável à dos Pulcinellas Bruno Leone e gato Salvatore, Don Roberto de Joan Paulo Cardoso, ou os melhores professores de Punch and Judy que eu conheci muito da minha vida marionetista. E, se falei desses nomes é porque a teoria de que todos esses teatros realmente surgem a partir do mesmo tronco comum vital, sustenta a tese vendo Chico Simões com seu teatro, movendo seus bonecos e dando-lhes vida com a voz e com a música de uma gaita que toca enquanto manipula. A vitalidade da arte é titeriteira mais refinada neste Mamulengo rápido e preciso, com gestos precisos, cenas magistralmente coreografadas com desempenho e pontuadas pelos pés, mãos ou os mesmos bonecos, com golpes harmônicos e percussivos.
Mas onde a tarefa é levantada ainda mais para os altos picos de boa arte titeriteira é nas alterações de voz e a definição dos personagens, com excelente capacidade rítmica do improviso e da “tagarelice musical” que transforma a função em um hilaridade constante de riso. Chico Simoes faz com que seus personagens conversem com os espectadores por meio de mal entendidos e constantes jogos de palavras, com os quais ele rapidamente consegue o público em seu bolso.
O argumento é muito simples e essa simplicidade é o lugar onde surge a vida feroz dos personagens, alguns equipados com um catarro jocoso e irônico, outros presos pelo puro nervo vital onde a síntese teatral mais extrema é destilada. O Vaqueiro Benedito é deste último, com seu touro clássico que permite jogos infinitos e rotinas coreográficas (com peido incluído). Muito perto de acordo com a “tourada” de Don Roberto, e ao mesmo tempo muito distante, livre da compulsão “tauromaquica” tão tipicamente ibérica. Você pode ver que Chico vem de um grande país onde as tradições de vários continentes convergem, e onde o “relaxamento” de uma cultura de “grande encorajamento” é percebida.
A história de amor de Benedito com Margarida vem do fundo, da antiga e sintética arte de amar da tradição titeriteira: tudo acontece a uma velocidade vertiginosa, e a conseqüência desses amores é o bebê inevitável, que mija, mija os pais e mija o público. Um tema relacionado a todas as tradições do gênero (lembre-se do bebê Punch, Pulcinella, Karakoz …). (o Mamulengo) Enfatiza o personagem do Capitão João Redondo, pai de Margarida, o “mau” da história, mais preocupado com o touro do que a filha, sua presença chama a Cobra que o público de pronto confundiu com um crocodilo, ocupando o mesmo papel que tem no Punch and Judy, bem como dragões e outros animais boca grande que abre e fecha engolindo tudo que vem pela frente. Claro, a Cobra come o Capitão João Redondo, e será finalmente o Vaqueiro Benedito, seu genro, que vai tirá-lo de problemas. Outro personagem interessante é o Bumba-Meu-Boi Estrela, bem como o velho negro cujo pescoço se estende por dois metros, personagem de origem africana, como nos disse o marionetista no final da apresentação. Igualmente impressionante foi o aparecimento de uma Morte representada pela cabeça do esqueleto de uma cabra, personagem popular brasileiro amplamente utilizado tanto em bonecos quanto em seu grande formato nos desfiles de certas festividades locais. Também foi cumprida aqui uma lei de quase todos os teatros de fantoches populares, para introduzir o caráter da Morte em suas histórias (embora aqui adquira seu próprio nome e pertença a um folclore de concreto). Outro personagem interessante é o Bumba-Meu-Boi Estrela, bem como o velho negro cujo pescoço se estende por dois metros, personagem de origem africana, como nos disse o marionetista no final da apresentação.
Ah, e no caso de um marionetista brasileiro, a dança não podia ser desperdiçada: quase todos os personagens dançam e cantam uma vez ou outra, com graça primorosa.O teatro de Chico Simões é elegante e ao mesmo tempo popular, com elementos de bambu que lhe dão um ar alegre e arquetípico. Sua simplicidade é eficaz, não poupa nem falta nada, como deveria ser. No final, pude ver dentro do teatro e o que mais gostei foi a mala, cheia de fotografias e lembranças de suas viagens, onde o marionetista mantinha seus fantoches um a um.
É um prazer e um verdadeiro luxo poder assistir a uma performance de tão alto nível em Barcelona, por um mestre de todas as idades, ainda jovem, pela sua sorte, pelo público e pela arte titeriteira.
quinta-feira, 28 de março de 2019
Pernambuco compõe ópera? Sim! Ao menos desde o séc. XIX., “Leonor” é a primeira ópera composta por um pernambucano, Euclides Fonseca, cujo material permanece disponível. Ela só foi exibida uma vez, no dia 07 de Setembro de 1883, e será reapresentada em sua concepção original no Teatro de Santa Isabel, nos dias 28, 29, 30/3 (quinta, sexta-feira e sábado), às 20h; e 31/3 (domingo), às 19h.
A montagem, que conta com incentivo do Governo do Estado de Pernambuco, por meio dos recursos do Funcultura, resgata uma ópera de cunho nacionalista e ambientada na Ilha de Itamaracá, à época da ocupação holandesa em Pernambuco. “Leonor”, com vibrante tom nacionalista, foi composta na segunda metade do século XIX pelo pernambucano Euclides de Aquino Fonseca (1853-1929): destacado defensor da memória e valores de sua terra natal; pianista; compositor; crítico e educador, atuou como cronista nos jornais Diário de Pernambuco e Jornal do Recife, além de ter sido correspondente de importantes revistas da Europa, onde redigia críticas sobre música contemporânea.
Inspirada em mais uma esquecida relíquia da cultura popular pernambucana, A Lenda das Mangas de Jasmim (sec.XVII), “Leonor” narra o infortúnio de uma mulher nobre e rica que, jovem, apaixona-se por um simplório, sendo correspondida. Ele pede a mão da moça em casamento, o pai dela recusa devido às modestas condições do pretendente.
Desesperado, o jovem lança-se na guerra contra os holandeses em busca de riqueza e glória, almejando retornar e reclamar a mão da amada. É insólito o destino, contudo, pois o jovem se fere gravemente em combate! Desaparece… É considerado morto! A jovem entra em depressão perene… Presa à sua dor, ela se torna uma senhora, residindo com seu irmão mais velho, Dom Nuno… Aquele jovem supostamente tombado em batalha, entretanto, sobreviveu! É Dom Antônio que, desiludido, enfim retorna à Ilha de Itamaracá ignorando o destino de sua amada, há tempos imaginando-a casada e com família, o que então o teria levado a se tornar padre. Leonor e Antônio se encontram, contudo, num final surpreendente, dramático…
A ópera possui um único ato, com duração aproximada de 1h, é composta para três cantores solistas – soprano/mezzo-soprano (Leonor), tenor (D. Antônio) e barítono (D. Nuno – irmão de Leonor), um coro de vozes mistas e uma orquestra de formação sinfônica. O coro são personagens que representam a vizinhança local, pescadores e senhoras da Ilha de Itamaracá. Os ingressos para a montagem custam R$ 20 (inteira) e R$ 10 (meia-entrada), e haverá uma sessão gratuita para escolas públicas e deficientes visuais no dia 29 de março, às 16h.
Elenco
Leonor: Jéssica Soares e Natalina Chikushi
Don Antônio: Diel Rodrigues e Lucas Melo
Don Nuno: Anderson Rodrigues e Tiago Costa
Leonor: Jéssica Soares e Natalina Chikushi
Don Antônio: Diel Rodrigues e Lucas Melo
Don Nuno: Anderson Rodrigues e Tiago Costa
Coro da Academia de Ópera e Repertório
Sinfonieta UFPE
Sinfonieta UFPE
Regência, Direção Cênica e Musical: Wendell Kettle
Figurino e Cenário: Marcondes Lima
Figurino e Cenário: Marcondes Lima
Produção Executiva: Jéssica Soares
Realização: Gárgula Produções, Academia de Ópera e Repertório e Sinfonieta UFPE
Incentivo: Governo do Estado de Pernambuco/ Funcultura/ Fundarpe/ Secretaria de Cultura
Serviço
Apresentação da ópera “Leonor”
Quando: 28, 29, 30/3 (quinta, sexta-feira e sábado), às 20h; e 31/3 (domingo), às 19h
Quanto: R$ 20 (inteira) e R$ 10 (meia-entrada)
Sessão gratuita para escolas públicas e deficientes visuais, no 29 de março, às 16h
Onde: Teatro de Santa Isabel
Apresentação da ópera “Leonor”
Quando: 28, 29, 30/3 (quinta, sexta-feira e sábado), às 20h; e 31/3 (domingo), às 19h
Quanto: R$ 20 (inteira) e R$ 10 (meia-entrada)
Sessão gratuita para escolas públicas e deficientes visuais, no 29 de março, às 16h
Onde: Teatro de Santa Isabel
quarta-feira, 27 de março de 2019
terça-feira, 26 de março de 2019
Por Chico Simões – abril de 2017
Voa o ano da graça de nosso senhor Jesus Cristo de dois mil e dezesseis para dois mil e dezessete. Estamos em Pernambuco. Tudo indica que o futuro chegou… A Zona da Mata Setentrional, cantada e decantada por sua riqueza cultural, tem de tudo, menos mata. Eucaliptos avançam em gigantescas ondas sobre os canaviais, cada vez mais minguados. Aqui e ali, cidades sem cidadania crescem em consumismo e miséria como um aglomerado de problemas sem solução visível. Esgotos correm a céu aberto e neles brincam crianças, como se brincassem em um rio.
A região é campeã mundial em microcefalia, causada pelo Zika Vírus, criado em laboratório para combater pragas em monoculturas, mas que, pegando carona no mutante mosquito Aedes Aegypti, voa como uma peste medieval, desgraçando a vida dos habitantes pobres desta Zona da Mata. Indústrias multinacionais de fármacos e outros venenos fazem da região um laboratório macabro, onde seres humanos, mesmo ainda em gestação, são cobaias de experiências que fabricam doenças para vender remédios.
Essa é a terra onde viemos passar o Natal e o Ano Novo seguindo complexos grupos de Cavalo Marinho e alguns Mamulengos, por estradas fora do mapa, dentro dos canaviais. Nesse caminho mágico, onde, às vezes, nos perdemos, às vezes, nos encontramos com outros grupos de “sulistas”, como nós, também perdidos, também se encontrando com o Mamulengo, que se encontra com o Cavalo Marinho e seus mistérios.
Alguns personagens do Mamulengo parecem ter saído diretamente do Cavalo Marinho para a tolda; Mané Gostoso, Capitão João Redondo, Caroca, Catirina, Palhaço da Vitória, Jaraguá, a Morte e o Boi, entre outros. Os músicos, sobretudo o “banco” de Mestre Zé de Vina , tocam “baiano”, a mesma música e os mesmos instrumentos do Cavalo Marinho. Ou seja, não estamos pisando um chão totalmente desconhecido, mas, mesmo assim, pisamos devagarinho e pedindo licença para entrar no terreiro. Viemos beber a garapa do fantástico imaginário engenho da cultura popular. A benção, nossos ancestrais africanos, que para cá vieram escravizados! A benção, nossos ancestrais indígenas nativos! Marinheiros portugueses! Comediantes da comédia de arte! Mestres e brincantes do Cavalo Marinho e do Mamulengo!
Adentramos no terreiro do Cavalo Marinho com muita emoção, mas tentando manter a razão. Já fomos alertados por pesquisadores(as) mais dedicados(as) e rigorosos(as), como Érico José Souza de Oliveira no Livro A Roda do Mundo Gira , sobre a impossibilidade de uma pesquisa superficial dar conta de abarcar o fenômeno. Considerando que, de qualquer ponto de vista, abre-se um leque de possibilidades, obrigando o(a) pesquisador(a) a escolher um caminho e, ao fazê-lo, perder a visão do todo, que mistura teatro, dança, rito, magia, música, política, relações de trabalho… enfim, várias formas de expressão simbólica da vida em um só e múltiplo “brinquedo”.
Antes nos deparamos com um atraso sócio econômico que nos remete à Idade Média e ao Renascimento, onde não podemos falar de atraso cultural, dado a riqueza e popularidade das manifestações artísticas. Ali e aqui nos encontramos com François Rabelais, o genial escritor francês do século XVI, que descreveu sem véu de alegoria toda a exuberância da cultura popular de sua época; uma cultura visceral, escatológica, ácida, anárquica e carnavalesca, como a cultura popular da zona da mata pernambucana do século XXI.
A impressão que temos ao assistir uma apresentação de Cavalo Marinho é a de que o tempo parou, o mundo pirou, tudo está ao avesso, desnudado, escancarado. As relações de poder invertidas, a moral questionada e a religiosidade zombada. A morte é a única justiça possível e, mesmo assim, será desafiada e ludibriada pelos anti-heróis Mateus, Bastião e Catirina, trio fantástico que conduz um enredo tão complexo quanto as tramas da Commedia dell’Arte, antes de Carlo Goldoni registrá-la, engessando as personagens em um eruditismo burguês e estéril, transformando brincadeiras abertas à participação do público em apresentações espetaculares, onde atores se exibem para uma quarta parede chamada público, que deve permanecer educadamente calado dentro das salas de espetáculo.
Mas voltemos ao nosso tempo da eternidade mágica do Cavalo Marinho pernambucano e mergulhemos um pouco mais na noite do brinquedo. Uma vez começada a festa, parece não ter fim. O “banco” de músicos vai tocar “baiano” acompanhando trupés, maguios, toadas, loas, incelenças e vivas durante toda a noite. Esses músicos fazem a “trilha”, o caminho iluminado do som por onde podem desfilar mais de setenta figuras, cada qual com sua “partitura”, tão peculiar quanto característica, tão particular quanto universal. São seres de outro mundo, almas, demônios, espíritos encarnados, animais comuns e imaginários, tipos ou arquétipos sociais bem definidos e reconhecíveis. O Capitão Marinho é quem comanda a brincadeira, mandando chamar Mestre Ambrósio, um mascate, vendedor de “figuras pra tudo que é festa”. Depois de uma breve mostra da “imitação” das figuras realizada por Seu Ambrósio, o Capitão compra todas e contrata o Trio Mateus, Bastião e Catita para “tomar conta e dar conta” do terreiro. Então, retira-se para só voltar depois de meia noite com os Galantes.
O público se entulha sem distinção nem reservas, crianças de colo, idosos(as), grávidas e deficientes físicos disputam com jovens bombados(as), bêbados(as), operários(as), agricultores(as) e alguns turistas ou pesquisadores(as), um lugar para passar a noite assistindo esse complexo teatro musical. Em volta da roda, uma pequena feira já está armada. “Comes e bebes” alimentarão o público e os brincantes durante toda noite. Tudo feito com rigor e precisão e ao mesmo tempo, improvisado e frouxo, para permitir a novidade incorporada como atualidade a cada função. E “haja pau” e “bexigadas” e “bota bom, bota bonzim.” Começou o Cavalo Marinho. O orgânico será purgado sem pudor.
A noite embriagada embala brincantes e assistentes num vertiginoso e catártico ritual, onde espectro e espectador experimentam um amálgama que só a cultura popular tradicional, desde os tempos mais remotos, pode alcançar. O terreiro é o espaço aberto no tempo, o “não lugar” da “eviternidade”, onde a celebração se plasma, um portal por onde desfilam seres do inconsciente coletivo, cada qual com suas mensagens subliminares, que podem ou não serem decodificadas pelos observadores.
Contratado para tomar conta, o trio Mateus, Bastião e Catirina toca o terror no terreiro, com graça e persistência, perturbando os músicos e o público, estabelecendo o caos, até que o “Soldado da Gurita” venha estabelecer a ordem, prendendo o trio, para que “Mané do Baile” possa chamar os “Galantes”, as “Damas” e “Arrelequino” que, conduzidos pela Estrela Guia do Oriente e o Capitão Marinho, vão cantar e dançar em louvor ao recém-nascido Menino Jesus, que não aparece na história.
Mestres e brincantes são unânimes em dizer que o brinquedo vem do “tempo da escravidão”, o tempo que a oralidade alcança as histórias que precisam, mesmo sem precisão, contar. Ou são as histórias que alcançam os homens que precisam para serem contadas? Seres humanos escravizados foram moídos por engenhos, que foram moídos por usinas, que estão sendo moídas por fábricas de celulose de eucalipto. Mas o Cavalo Marinho não morre, porque se move pela fé, pela força intrínseca ao grupo comunitário que o compõe e com ele se identifica e, por ele, tanto vive quanto morre.
Aqui, a profecia glauberiana faz todo sentido: “cultura popular não é o que se chama tecnicamente de folclore, mas uma linguagem em permanente rebelião histórica. Somente os intelectuais desligados da razão burguesa em consonância com os signos mais profundos dessa cultura popular é que configurarão um signo verdadeiramente revolucionário”.
Aos poucos, o Cavalo Marinho, que sobreviveu e resistiu, vai se transformando para se adaptar às novas realidades. Hoje, o pouco tempo para cada apresentação e outros fatores externos “prejudica” o brinquedo, segundo os(as) brincantes, deixando para segundo plano muitas “figuras” importantes, enquanto os trupés, maguios, danças dos arcos e passeios vão se sobressaindo. Figuras mascaradas com seus dramas ganham versões reduzidas para que as apresentações, que podem durar uma noite inteira, sejam feitas em uma ou duas horas.
De brinquedo de escravos(as) e trabalhadores(as) das lavouras da cana e do engenho, o Cavalo Marinho passou a ser praticado por outros(as) atores e atrizes, de outras formações culturais e propósitos. A brincadeira ganha, pouco a pouco, novos terreiros, e sai do ciclo natalino para se apresentar em qualquer época do ano. Nesse movimento assistimos um jogo de perde e ganha que, às vezes, assusta e, às vezes, anima os sujeitos dessa história sem fim.
Pura magia, o Cavalo Marinho está solto e, no trupé do trote, avança rumo ao futuro como o Boi, que, ao nascer do sol, vai viver sua paixão, será sacrificado, comungado e ressuscitará para que a brincadeira, como a vida, possa seguir sendo reinventada a cada apresentação.
Para o incômodo de folcloristas e puritanos(as) conservadores(as), o Cavalo Marinho, hoje, é praticado, não apenas fora do ciclo natalino, como também, fora dos terreiros do canaviais da Zona da Mata Pernambucana. Grupos de brincantes de Recife, Olinda, São Paulo, Rio de Janeiro, Belo Horizonte e Brasília, que também beberam na fonte e no convívio com mestres(as) e brincantes e, “sem o verniz armorial que engessa o brincante e a brincadeira”, são alimentados pela tradição que, para sobreviver, precisa se adaptar às sempre novas exigências da atualidade, ou seja, morrer e ressuscitar.
Não sabemos se escolhemos ou fomos escolhidos. O certo é que brincamos teatro procurando dignificar a herança recebida dos(as) mestres(as), não apenas repetindo o que eles fazem, mas acrescentando a nossa própria visão de mundo, atualizando sem descaracterizar as brincadeiras no que elas conservam de essencial; uma estrutura ao mesmo tempo móvel e segura, resiliente, permitindo que o brinquedo sobreviva, adaptando-se ao tempo e ao espaço, para exatamente romper com eles e fortalecer sua existência na eternidade de São Saruê, “onde vive tudo que se imagina.”
segunda-feira, 25 de março de 2019
GONZAGA DO REISADO DE GARANHUNS
No Sítio Sussuarana, zona rural de Garanhuns, nasceu Luiz
No Sítio Sussuarana, zona rural de Garanhuns, nasceu Luiz
Gonzaga. Nome de mestre, ele tem, além de ser conterrâneo
de outro grande da música, Dominguinhos. Porém, desde
1955,Gonzaga de Garanhuns, como é conhecido, escolheu o
reisado, folguedo popular tradicional do Agreste pernam -
bucano, e a literatura de cordel para se expressar ar-
tisticamente. Quem é nascido ou vive na cidade,
de outro grande da música, Dominguinhos. Porém, desde
1955,Gonzaga de Garanhuns, como é conhecido, escolheu o
reisado, folguedo popular tradicional do Agreste pernam -
bucano, e a literatura de cordel para se expressar ar-
tisticamente. Quem é nascido ou vive na cidade,
A produtora cultural e atriz Stephany Metódio já vinha
sentindo a necessidade de produzir registros audiovisuais da
história cultural da
sentindo a necessidade de produzir registros audiovisuais da
história cultural da
sua cidade. Durante uma das ações do Sesc, quando ela
conheceumais a história e trajetóri de Seu Gonzaga, ime-
diatamente teve a ideia de produzir um documentário.
“Quando me aproximei mais dele, na época que trabalhava
com o Sesc, conversamos e, em seguida, ele levou um mon
conheceumais a história e trajetóri de Seu Gonzaga, ime-
diatamente teve a ideia de produzir um documentário.
“Quando me aproximei mais dele, na época que trabalhava
com o Sesc, conversamos e, em seguida, ele levou um mon
Em Pernambuco, o reisado proveniente de Garanhuns é con-
siderado referência e devido à preocupação de cada vez mais
registrar as manifestações culturais da cidade, o grupo Tear,
formando por Stephany e por outros artistas como Alexandre
Revoredo, Efraim Rocha, Leo Silva, Katarina Barbosa, Renan
Araújo – que assina a direção do documentário –, Andrezza
Tavares e Fernanda Limão, juntaram suas habilidades e in-
siderado referência e devido à preocupação de cada vez mais
registrar as manifestações culturais da cidade, o grupo Tear,
formando por Stephany e por outros artistas como Alexandre
Revoredo, Efraim Rocha, Leo Silva, Katarina Barbosa, Renan
Araújo – que assina a direção do documentário –, Andrezza
Tavares e Fernanda Limão, juntaram suas habilidades e in-
de Incentivo à Cultura, na categoria de descentralização do
audiovisual, que foi aprovado e teve início no ano seguinte.
Eles pretendem circular com o documentário no Festival de
Goiana, no de Triunfo e
audiovisual, que foi aprovado e teve início no ano seguinte.
Eles pretendem circular com o documentário no Festival de
Goiana, no de Triunfo e
no Festival de Inverno de Garanhuns, que acontece este mês.
Em entrevista à Continente, Seu Gonzaga relembra alguns
momentos marcantes de seus 73 anos de vida, que são reto -
mados no filme, a exemplo da cria
ção na roça pelo avô Valdivino Lopes, a primeira vez que viu
uma apresentação do reisado com o Mestre José Pereira, em
1954; ou quando participou do programa Som Brasil, de Rolando
Boldrin, nosanos 1980, junto ao reisado do Mestre João Gomes.
As motivações
momentos marcantes de seus 73 anos de vida, que são reto -
mados no filme, a exemplo da cria
ção na roça pelo avô Valdivino Lopes, a primeira vez que viu
uma apresentação do reisado com o Mestre José Pereira, em
1954; ou quando participou do programa Som Brasil, de Rolando
Boldrin, nosanos 1980, junto ao reisado do Mestre João Gomes.
As motivações
em perpetuar a cultura popular o fazem participar de diversas
ações nas escolas de Garanhuns. “Nosso estado tem muitas ma-
nifestações populares e é isso que eu abraço, porque acho muito
importante ficar
ações nas escolas de Garanhuns. “Nosso estado tem muitas ma-
nifestações populares e é isso que eu abraço, porque acho muito
importante ficar
para Pernambuco. Por isso, estou formando crianças.”
sábado, 23 de março de 2019
Adiel Luna ,Nasceu em Tiúma,bairro de São Lourenço da Mata,caminho entre a zona da mata norte e região metropolitana do Recife. Morou dez anos em Camaragibe, cidade conhecida por seus caboclinhos e terra e grandes coquistas. A relação de Adiel Luna com a música vem de berço. Sua bisavó era cantadeira de casa de farinha e conheceu seu avô animando uma farinhada. Seu avô era entusiasta da cantoria de viola e seu pai como alguns-assim como tios e primos - são poetas e repentistas. Cresceu assistindo madrugadas de cantorias no sitio da família e desfrutou deslumbrado deste ambiente onde a brincadeira, a festa, acontece de forma genuína.
À medida que foi se apaixonando pela poesia tradicional e se debruçando sobre ela,foi descobrindo outros tipos de manifestações que não faziam parte do terraço de casa. Mas que acabaram sendo levadas por cantadores com quem esbarrou por ali.É assim : Tem cantador que também é maracatuzeiro. Tem cantador que é coquista. Outro que mexe com a toada de gado. E assim foi se ampliando o universo.
Abraçando a poesia e a música com paixão e profissão, esteve atento e disposto a assimilar, aprender e aperfeiçoar modalidades da poética tradicional cantadas e de suas variações regionais.
Hoje, é coquista ,mestre de baque solto,violeiro,cantador repentista e cordelista. Sua bagagem como brincante e seu diálogo constante e respeitoso com os mestres,as práticas,os terreiros tradicionais e as oralidade destas manifestações destas manifestações marca seu diferencial,permitindo-o passear com uma agilidade impar no improviso.
A este acúmulo , acrescenta uma renovação, típica de quem saiu do campo para a cidade e que não pode - nem quer - Com uma batida marcante desconsiderar as influências urbanas. O contato entre estes dois domínios resulta num trabalho extremamente original e sofisticado.
Em 2002, formou o grupo Coco Camará e juntos,iniciaram um resgate histórico das coquistas antes existentes na cidade, na busca de um som único e tradicional. Com uma batida marcante, letras de fácil memorização e inúmeros improvisos, Adiel e Coco Camará chegou a ser convidado para participar do Kainival der Kuluren, evento cultural realizado em Berlim,Alemanha, representando a cultura popular pernambucana.
Em 2002, formou o grupo Coco Camará e juntos,iniciaram um resgate histórico das coquistas antes existentes na cidade, na busca de um som único e tradicional. Com uma batida marcante, letras de fácil memorização e inúmeros improvisos, Adiel e Coco Camará chegou a ser convidado para participar do Kainival der Kuluren, evento cultural realizado em Berlim,Alemanha, representando a cultura popular pernambucana.
Seu repertório autoral passeia por contextos nordestinos e elementos singulares de sua identidade - paisagens, religiosidade, cotidiano,histórias, sonoridades - numa dinâmica rara,refinada e bastante rica.
sexta-feira, 22 de março de 2019
Os últimos dias de um reinado
O cerco se fechava
Por Sálvio Siqueira
Desde o segundo meado do séc. XVIII que o cangaço infestava as terras nordestinas. O Fenômeno Social surgiu na zona canavieira pernambucana e, aos poucos, migra para o interior do Estado das Alagoas numa época denominada na História como “A Era do Couro” e, em sequência, estende-se aos sertões dos Estados vizinhos.
O interior pernambucano, mais precisamente a microrregião Pajeú das Flores, torna-se um verdadeiro celeiro de cangaceiros. Porém, da Paraíba, Ceará, Rio Grande do Norte, Sergipe, Bahia e do próprio Alagoas, começam a surgir inúmeros bandoleiros por ‘n’ motivos. Nesse tempo, final do Império e início da República Velha, o sertão nordestino estava infestado por esse tipo de banditismo. As autoridades dos vários Estados da Região Nordeste assolados pelos bandos fazem de tudo para darem fim, ou pelo menos diminuírem, esse tipo de criminosos rurais, sem conseguirem seus intentos.
Ocorreram vários fatores que impediram o extermínio dos bandos de bandoleiros naquela época. O contingente das Províncias, depois Estado, não era grande, e o pouco que tinham não poderia enviá-las para o foco do problema para não correrem o risco de ações criminosas nas zonas urbanas que também viviam abarrotadas de problemas inclusive com imigrantes dos interiores. As longas e cruéis estiagens deixavam quase que impossível algum ser humano viver, ou conviver, dentro da caatinga.
Não havia água nem comida disponível para abastecer as tropas.
A comunicação via telégrafo não existia em todo lugar. As volantes sabiam de onde iriam partir, porém, jamais sabiam para onde iriam nem tão pouco quando chegariam a algum lugar habitado. Os governadores até que tentavam, na medida do possível, abastecerem os locais com praças, no entanto, ocorre um grande problema causando o impedimento da continuação dessa ação devido o soldado, formado em outras terras e usando equipamento inadequado, adoecerem, principalmente dos pés ao ponto de não conseguirem prosseguir com as perseguições. A falta de estradas era outro empecilho que as volantes tinham para transporem. E outros problemas mais...
Além de todos esses problemas, havia o ataque nas emboscadas colocadas pelos bandoleiros abrindo brechas enormes nas fileiras das tropas.
O soldado não sabia em quem confiar, passando a usar um modo operante totalmente equivocado onde todo e qualquer roceiro eram suspeitos. Com essa maneira errada de trabalhar, em vez de conquistarem os sertanejos, conseguiram foi o seu afastamento e falta de colaboração. Vendo essa insatisfação dos sertanejos os chefes dos bandos usam de tática diferente. Protegendo, ajudando e respeitando vários deles, com outros usaram também a ‘moeda’ de troca de favores. Então começa a surgirem, a se criar, uma malha de protetores e colaboradores onde, mais tarde, essa mesmo é o fator principal da longevidade do Fenômeno Social. Essa “malha” foi alimentada por “favores”, dinheiro e proteção dos chefes cangaceiros. No decorrer do tempo, grandes latifundiários e produtores rurais começam a fazerem parte da mesma, assim como pequenos e grandes comerciantes e até militares. A falta de receberem o seu pequeno soldo, vários soldados desertam da Força Militar e se engajavam aos vários bandos nômades de bandoleiros levando seu fardamento, armas e munição.
Essa pirâmide de colaboradores tem sua maior extensão quando do cangaço implantado pelo chefe cangaceiro Virgolino Ferreira, alcunhado de Lampião, o “Rei dos Cangaceiros”, entre os anos 1918/19 e 1938, segunda personagem mais biografada na América Latina. Lampião não foi o criador da malha de colaboradores nem foi o criador da ‘guerra de movimentos’, mas foi aquele que mais a aperfeiçoou no decorrer de seu cangaço nos contrafortes da Mata Branca, onde tendo a contribuição dessas e outras táticas, conseguiu permanecer por quase longos vinte anos assombrando o sertão nordestino. Porém, como tudo nessa vida tem seu início, meio e fim, na segunda metade da década de 1920, o cangaço começa a sofrer tombos que algum tempo depois o leva ao clímax, ao epílogo de uma era sangrenta, dolorosa e enlutada para os sertanejos.
Os anos considerados mais gloriosos das ações cangaceiras estão entre 1919 e 1927, já na fase do cangaço lampiônico, mesmo haverem, na época, mais de 40 bandos com chefes distintos nos sertões dos Estados nordestinos, o comandado por Lampião destaca-se notoriamente, apesar de entre os anos de 1921 e 1922 a Força Pública pernambucana ter sido uma ‘pedra nas Xô-boi’ dos bandos na região do Pajeú das Flores. Até fins de 1926 e início de 1927 os cangaceiros tinham um ‘aliado’ bastante benéfico: era que as tropas militares em perseguição aos bandos de cangaceiros não podiam transpor as divisas de Estado, legalmente, dando continuação a uma perseguição.
Quando Estácio Coimbra assume o governo do Leão do Norte em fins de 1926, nomeia o jovem Eurico de Sousa Leão, Chefe da Segurança do Estado. Estudando o problema do banditismo nos confins do sertão, após a colaboração do Chefe de Gabinete, sociólogo Gilberto Freire e do ex chefe cangaceiro preso desde 1914 na Casa de Detenção do Recife, Antônio Silvino, Manoel Batista de Morais, elaboram um plano, dentro desse uma emenda donde surge uma nova “Lei” para colaborar com o Estado no combate ao banditismo rural. Essa “Lei” fica conhecida nas hastes da historiografia cangaceira como “A Lei do Diabo”. Coimbra, através do Chefe de Segurança, convoca os governadores e/ou representantes dos Estados envolvidos com o problema e dessa resulta a liberação para que as volantes tivessem livre acesso em qualquer um dos territórios não importando a qual deles pertencesse.
No plano colaborado pelo “Rifle de Ouro” determinam-se focar as investigações e ações militares na malha colaboradora, roceiros, vaqueiros, militares, fazendeiros, comerciantes e etc.. Até aquele momento todas as tentativas de combaterem o banditismo rural focava-se diretamente em sua figura maior, Lampião. Silvino, tendo sido chefe cangaceiro, sabia que dentro da ‘malha’ de colaboradores existiam aqueles que serviam de ‘pombos-correios’, servindo quase que exclusivamente para levar e trazer recados, notícias e etc.. A coisa estava tão séria que mesmo antes de uma ordem direta para determinado comandante de volante chegar ao mesmo, Lampião já estava ciente da mesma.
Com isso tinha tempo para organizar uma emboscada ou mesmo mudar totalmente sua direção apagando seus sinais. Podemos concluir que a partir daí inicia-se o começo do fim do Fenômeno Social. Logicamente, devido a inúmeros obstáculos surgidos, como por exemplo, uma extensão territorial enorme, colaboradores na alta sociedade e militares de alta patente, leva-se mais de 10 anos para terem o resultado final, para que o laço fosse se fechando objetivando a extinção do Cangaço.
Uma das decisões principais para que se desse fim ao movimento social cangaço, a nosso ver, foi à admissão de sertanejos nas colunas militares perseguidoras. A ‘matéria prima’ para formar-se um cangaceiro era um vaqueiro, um roceiro, um sertanejo nato, homem disposto, sem medrar a nada, nem mesmo a morte, estava pronto para tudo. Além disso, fora forjado em um ambiente duro, cruel, sentindo na pele a selvageria causada pelos homens dos ‘coronéis’ em seus familiares, amigos e conhecidos. Então, quando da decisão de nomear homens do sertão, vaqueiros, roceiros e sertanejos natos, a coisa começou a ficar equilibrada. Havia homens de mesmo ‘quilate’ de ambos os lados e todos eram conhecedores dos perigos da caatinga. Vestimentas, calçados e coragem agora estavam equidistantes. Os comandantes militares locados em diversas cidades interioranas tiveram a ordem de admitir aquele que quisesse fazer parte da Força Pública, aqueles que quisessem ser contratados e ainda de aceitarem a ajuda daqueles que se fizessem voluntários, por ‘n’ motivos, para darem combate aos cangaceiros. Aí passou a ser “cobra engolindo cobra”.
Lampião, em princípios de 1926 é convocado para fazer parte do Batalhão Patriótico, medida tomada pelo Governo Federal com o intuito de dar combate a “Coluna Prestes” em vários Estados da Nação, situado na cidade de Juazeiro do Norte, CE. Virgolino recebe a patente de Capitão Provisório dos Batalhões Patrióticos, consequentemente, seu Estado-Maior também recebe suas devidas divisas militares. Além disso, a agora ‘tropa militar’, recebe dinheiro, uniformes e equipamento bélico de alta precisão para a época. O bando de Lampião torna-se tão forte que em novembro daquele mesmo ano, no local chamado Serra Grande, no município de Calumbi, PE, causa a maior derrota até hoje registrada a Polícia Militar de Pernambuco. Porém, essa vitória deixa o chefe mor do cangaço bastante afoito, fugindo notadamente de sua maneira de agir, e no primeiro meado do ano seguinte sofre grande derrota em terras potiguares.
Fugindo com o rabo entre as pernas, o bando do “Rei Cego” a cada investida das Forças Públicas de vários Estados vai diminuindo rapidamente. Tanto que no segundo meado de 1928, contando apenas com cinco homens, migra para terras baianas onde remonta seu império do terror. A maneira de Virgolino agir, suas táticas empregadas, sempre chamou atenção até entre seus perseguidores e inimigos. Sempre planejando antes de agir, causa grandes baixas nas fileiras das colunas militares que sai em sua perseguição.
Logicamente não se tratava apenas de táticas no campo de batalha, também havia aquela usada junto aos colaboradores, principalmente aqueles que tinham o dever de persegui-lo.
Ficando um bom tempo na ‘moita’, Lampião começa a conquistar os baianos. Aos poucos vai recrutando e aumentando, novamente, o contingente de seus asseclas. Porém, Lampião depois de algum tempo, sai da Bahia e vai instalar-se em terras sergipanas, ficando o território baiano como zona de ataques periódicos. No início dos anos 1930, “O Cocho” toma uma decisão fantástica em termos de guerrilha: divide seu bando em pequenos grupos e cada grupo com seus respectivos chefes. Com isso as Forças perseguidoras ficam um tanto desbaratinadas sem saberem ao certo quando, realmente, estavam dando combate ao cangaceiro mor do Pajeú das Flores. Essa ação deixa até os jornais, meio único de comunicação em massa na época, desnorteados e, automaticamente, seus leitores. Há, nos arquivos de vários periódicos, ações noticiadas de em um mesmo dia, em cidades distintas e longe uma da outra, praticadas pelo “Rei do Cangaço”. Quando na verdade eram praticadas por asseclas daqueles pequenos grupos.
Após as pancadas que levou no lombo no decorrer da década de 1920, seu primeiro decênio de reinado, o terceiro filho de José Ferreira já no envelhecer do corpo físico, mantem-se mais nos acampamentos. Entre fins de 1936 e início de 1937 até meados de 1938, quando de sua morte, Lampião passou a comandar diferentemente seus cabras. Nessa fase, o “Rei Cego” passa quase que exclusivamente a executar os famosos bilhetes de extorsão e enviar cangaceiros e coiteiros de confiança para que trouxessem mantimentos, armas e munição. O chefe cangaceiro distribui entre a população, nessa época, seu ‘passaporte’ de livre passagem. Para se transitar pelo sertão fazia-se necessário pagar um percentual ao neto predileto de dona Jacoza, ou corria o risco de enfrentar a boca de um fuzil ou a ponta de um punhal. E não eram apenas os ‘pequenos’ que sofriam de imposição, os grandes produtores, industriais, fazendeiros e latifundiários também faziam parte das ‘colaborações’.
“(...) No atacado, no plano dos grossos capitais, houve o caso exemplar da fábrica de tecidos da Pedra, em Alagoas, cujo caminhão somente teve a jornada diária garantida, as cargas não mais deixando de atingir a ponta do trilho da Great Western em Rio Branco, (Arcoverde) Pernambuco, a cada dia, quando o gerente, José Borba, despiu-se dos escrúpulos e sentou à mesa discretamente com Lampião, lá mesmo na vila alvíssima do finado coronel Delmiro Gouveia, em meio a goles de uísque. Onerada a folha da empresa em um conto de réis por mês, o sossego fez-se total. Negócio bom é o que interessa a ambos os lados, devem ter pensado industrial e cangaceiro (...).” (MELLO, pg 251, 2012)
Alguns jornais começam a prestar um serviço digno para a população e com isso começa a ‘balançar’ o poder daqueles que tinham as ‘rédeas do poder nas mãos’. Outros, pensando apenas em vender seu produto, até inventar inventam notícias sobre o que ocorria nos sertões dos Estados: na aurora de 1938 o jornal Diário de Notícias, da cidade soteropolitana, Capital do Estado da Bahia, noticia a morte de Virgolino Ferreira. O cangaceiro mor teria morrido vítima de tuberculose em sua própria cama. Hoje podemos até darmos risadas de uma notícia dessas, porém, naquele tempo as coisas eram por demais sérias, tanto que a notícia é postada pelo jornal nova-iorquino New York Times, onde disse: “O fora da lei número um morre em sua cama, no Brasil”. (MELLO, pg 270, 2012)
De uma ou de outra forma os Jornais levaram as informações ao público. Em fim, prestando excelentes serviços. Tanto que a população dos grandes centros urbanos começa a exigir mais e eficientes ações das autoridades. Alguns vespertinos, já tendo o povão ao seu lado, começam a ‘apertar’ o nó de cânhamo no gogó de alguns chefes militares envolvidos diretamente com as ações no combate ao banditismo rural. Nas Alagoas o alvo é diretamente o comandante do II Batalhão, major, na época, José Lucena de Albuquerque, em Pernambuco a coisa recai no lombo do tenente Luís Mariano da Cruz, ‘sucessor’ de Manoel de Souza Neto que havia deixada a Força Volante voluntariamente em janeiro de 1936.
O oficial pernambucano, tenente Luís Mariano, natural do município de São José de Belmonte, PE, é tido como um dos grandes e valorosos oficiais que deram combate aos cangaceiros. O comandante pernambucano, sendo entrevistado por um repórter do Diário de Pernambuco em fins de 1937, diz: “Lampião faz uso dos seus retratos como salvo-conduto, que ele autentica com sua firma e entrega às pessoas que lhe pagam determinado tributo e ao grupo, e que lhes prestam completa lealdade e obediência (...) nesses últimos tempos, tem-se embrenhado nas caatingas do Estado de Sergipe e se demora principalmente nos município de Porto da Folha, Simão Dias, Aquibadã, Gararu e Frei Paulo, sendo nesse último município que o bandido-chefe fez, com certa segurança, o seu quartel-general.
De quando em vez, Lampião, à frente de uma parte de seu grupo, invade a Bahia, entrando ali pelos municípios de Jeremoabo, Cícero Dantas e Paripiranga, que separam os Estados da Bahia e Sergipe. Nessas excursões, pratica grandes roubos e depredações, e retorna aos lugares que lhes servem de coito, onde descansa por meses oculto, guardado por coiteiros de sua absoluta confiança(...).”
Já o periódico “Gazeta de Alagoas”, em sua edição de 9 de julho de 1937, usando um pseudônimo chamado de “Sertanejo”, ataca diretamente o comandante do II Batalhão localizado em Santana do Ipanema, AL, “... alguma de lamentável venha ocorrendo no policiamento feito por alguma volante”, cobrando-lhe, antes e depois, maiores resultados nas ações contra o banditismo. Passa-se mais de trinta dias para que o major Lucena desse uma resposta, em 5 de agosto daquele ano, jogando toda a culpa nas costas dos coiteiros: “... se encontram naturalmente nos coitos, amparados e recebendo munições(...) de modo algum prestam auxílio à polícia.” Citando ainda que as Forças de Combate “trabalham com uma única esperança: a casualidade”. O comandante Lucena se ver tão apertado que se dirige diretamente, através de um boletim/telegrama, ao comandante-geral coronel Teodureto Camargo do Nascimento o qual o jornal Folha de Maceió consegue e o publica, na íntegra, em sua edição do dia 13 de agosto de 1937:
“Sipanema – Pls. 93-91, data 11, Hora 11h10, Cel. Teodureto – Reg. Policial Militar, Maceió
Estou posse recorte jornais contendo acusações ação força contra banditismo. Não me admiro isto parta Mata Grande, onde há maiores coitos bandoleiros. Vislumbro bem quais responsáveis artigos, os quais, antes 1930, acoitavam cangaceiros e hoje, mais criminosamente ainda, o fazem. Tais autores deviam, antes de mentir, se preocuparem com misérias deles próprios. Fique pois, digno comandante, tranquilo que saberei cumprir meu dever. Vou responder artigos jornais, pois estou disposto aceitar luta. Saudações – José Lucena de Albuquerque Maranhão, major comandante II Batalhão.” (MELLO, pg 260. 2012)
Depois dessa postagem da “Folha de Maceió”, o “Sertanejo”, através das páginas da “Gazeta de Alagoas”, compra a briga definitivamente e desce o ‘cacete’ no comandante do II Batalhão. Em 18 de agosto, dirigindo-se diretamente a José Lucena, diz: “devia estar em Mata Grande, com seu trabalho, não em Santana do Ipanema”. Referi ainda sobre os criminosos citados pelo major, “criminosos de antes ou de depois de 1930, que tudo seja apurado!”.
Rapaz, depois dessa Lucena fica vendo as saídas se fechando. Apertado, redige imensa carta e envia-a ao jornal que a posta no dia 21 do mês. Nessa carta o major tenta argumentar sobre uma ‘possível’ colaboração de seus subordinados aos cangaceiros: “...quem luta com quatrocentas naturezas espalhadas em todo sertão, por mais que seja rigoroso será surpreendido, vez por outra, com irregularidades de subordinados”. Para nós, há uma concordância em que alguém da corporação, ou mesmo alguns militares, colaboravam com os cangaceiros. O rebu é grande e a população fica na expectativa das providências que serão tomadas pelas autoridades. Porém, só em outubro é que o governador de Alagoas, Osman Loureiro, lança na Gazeta de Alagoas sua determinação de que o II Batalhão permanecerá em Santana do Ipanema.
No dia 11 de novembro daquele ano, Getúlio Vargas, através do Decreto nº 19.398, dissolve o Congresso e dá um golpe no regime que o colocou no Palácio do Catete, implantando uma Ditadura, O Estado Novo. São criadas as Delegacias de Ordem Política e Social, linha dura, e é decretada a pena de morte gerando grande impasse nos redutos advocacionais. O Decreto-Lei 88, sobre a novíssima LSN, Lei de Segurança Nacional, em seu Arti. 122, inciso 13, alínea f, rezava claramente que seriam tomadas medidas radicais no “homicídio cometido por motivo fútil ou com extremos de perversidade”. Logicamente esses termos eram dirigidos para aqueles contrários ao Novo Regime e aos bandos de cangaceiros e seus colaboradores, nunca para as perversidades praticadas pelas volantes. O sociólogo Frederico Pernambucano de Mello, diz a respeito: “parecendo mirar o dia a dia dos cangaceiros e de seus protetores. Carapuça certeira. Cabia o alarme entre chefes políticos do sertão. Entre os favorecedores mais eficientes do cangaço, incorrigíveis até ali”.
No início de 1938, o major José Lucena, comandante do II Batalhão em Santana do Ipanema, AL, é convocado para comparecer urgentemente a presença do coronel Teodureto na Capital do Estado:
“(...) o coronel Teodureto ansiava por ter com ele uma conversa reservada, com vistas a “identificar o dedo misterioso que incidia sobre o contexto da campanha (contra o cangaço) e levava àquele resultado deplorável”. Homem enérgico, embora polido, como se impõe a um oficial superior do Exército, Teodureto abre a fala ressalvando “que não punha em dúvida a lealdade e a competência do seu subordinado, mas que precisava descobrir a causa da frustração e eliminá-la custasse o que custasse”. E porque “cumpria restaurar a confiança das populações massacradas pelo cangaço nas providências de governo”, pontuava palavra por palavra, “não abriria mão, a partir de agora, de ação efetiva e ajustada, sob pena de apelar para medidas drásticas e até arbitrárias contra aqueles que fossem apanhados violando suas determinações”. Lucena pouco fala. Ao fazê-lo, já no final, somente lhe acode rememorar o que dissera à imprensa na polêmica de meses atrás: que lhe parecia impossível garantir a honradez de cada uma das quatrocentas individualidades que comandava no sertão. E deixa o Regimento policial “tão amargurado, que ruma dali para a catedral, a fim de orar e pedir a Deus ânimo e luzes para se safar do sério embaraço em que se via metido”. (MELLO,pgs 268 a 269. 2012)
A partir daí, já vinda desde o Palácio do Catete, a ordem de acabar com Lampião vai passando de esfera em esfera de comando. Cada um que passasse a batata quente para as mãos do seu subordinado imediato. As autoridades lançam panfletos deixando a população ciente de que suas ações tinham carta branca, ou seja, podiam usar as ações que quisessem que o Estado os protegiam. Ocorre uma ruma de gente que deixa seus lugares onde moram e caem no mundo. Outros, já da alta, mudam de lado e começam a serem colaboradores das volantes, outros, porém, não deu tempo e são trancafiados. Mesmo assim alguns gatos pingados, devidos à grana ser alta, permanecem colaborando com Lampião, não outro chefe, apenas ao “Rei dos Cangaceiros”.
Entre os cangaceiros, também há deserções, pois sabiam que o cerco se fechava cada vez mais.
Aqueles que fizeram parte das fileiras cangaceiras não tinham nenhum compromisso com seus companheiros. Ninguém era por ninguém e cada um que defendesse sua vida particularmente. O respeito e a solidariedade entre eles se baseavam em valores financeiros. Se qualquer um deles tivesse tido a oportunidade de matar o cangaceiro mor, Lampião, para apossar-se de seus ‘bens’, da grana e valores em joias e ouro que levava consigo, com certeza o teria matado. Excetuando-se, logicamente, algumas personagens como Luiz Pedro, na ocasião de sua morte, um Mariano anteriormente, um Gato, Sabino e etc... O cangaço estava prestes a acabar.
Fonte: Lampiao aceso.
Por Sálvio Siqueira
Desde o segundo meado do séc. XVIII que o cangaço infestava as terras nordestinas. O Fenômeno Social surgiu na zona canavieira pernambucana e, aos poucos, migra para o interior do Estado das Alagoas numa época denominada na História como “A Era do Couro” e, em sequência, estende-se aos sertões dos Estados vizinhos.
O interior pernambucano, mais precisamente a microrregião Pajeú das Flores, torna-se um verdadeiro celeiro de cangaceiros. Porém, da Paraíba, Ceará, Rio Grande do Norte, Sergipe, Bahia e do próprio Alagoas, começam a surgir inúmeros bandoleiros por ‘n’ motivos. Nesse tempo, final do Império e início da República Velha, o sertão nordestino estava infestado por esse tipo de banditismo. As autoridades dos vários Estados da Região Nordeste assolados pelos bandos fazem de tudo para darem fim, ou pelo menos diminuírem, esse tipo de criminosos rurais, sem conseguirem seus intentos.
Ocorreram vários fatores que impediram o extermínio dos bandos de bandoleiros naquela época. O contingente das Províncias, depois Estado, não era grande, e o pouco que tinham não poderia enviá-las para o foco do problema para não correrem o risco de ações criminosas nas zonas urbanas que também viviam abarrotadas de problemas inclusive com imigrantes dos interiores. As longas e cruéis estiagens deixavam quase que impossível algum ser humano viver, ou conviver, dentro da caatinga.
Não havia água nem comida disponível para abastecer as tropas.
A comunicação via telégrafo não existia em todo lugar. As volantes sabiam de onde iriam partir, porém, jamais sabiam para onde iriam nem tão pouco quando chegariam a algum lugar habitado. Os governadores até que tentavam, na medida do possível, abastecerem os locais com praças, no entanto, ocorre um grande problema causando o impedimento da continuação dessa ação devido o soldado, formado em outras terras e usando equipamento inadequado, adoecerem, principalmente dos pés ao ponto de não conseguirem prosseguir com as perseguições. A falta de estradas era outro empecilho que as volantes tinham para transporem. E outros problemas mais...
Volante atuando no Estado da Bahia
O soldado não sabia em quem confiar, passando a usar um modo operante totalmente equivocado onde todo e qualquer roceiro eram suspeitos. Com essa maneira errada de trabalhar, em vez de conquistarem os sertanejos, conseguiram foi o seu afastamento e falta de colaboração. Vendo essa insatisfação dos sertanejos os chefes dos bandos usam de tática diferente. Protegendo, ajudando e respeitando vários deles, com outros usaram também a ‘moeda’ de troca de favores. Então começa a surgirem, a se criar, uma malha de protetores e colaboradores onde, mais tarde, essa mesmo é o fator principal da longevidade do Fenômeno Social. Essa “malha” foi alimentada por “favores”, dinheiro e proteção dos chefes cangaceiros. No decorrer do tempo, grandes latifundiários e produtores rurais começam a fazerem parte da mesma, assim como pequenos e grandes comerciantes e até militares. A falta de receberem o seu pequeno soldo, vários soldados desertam da Força Militar e se engajavam aos vários bandos nômades de bandoleiros levando seu fardamento, armas e munição.
Essa pirâmide de colaboradores tem sua maior extensão quando do cangaço implantado pelo chefe cangaceiro Virgolino Ferreira, alcunhado de Lampião, o “Rei dos Cangaceiros”, entre os anos 1918/19 e 1938, segunda personagem mais biografada na América Latina. Lampião não foi o criador da malha de colaboradores nem foi o criador da ‘guerra de movimentos’, mas foi aquele que mais a aperfeiçoou no decorrer de seu cangaço nos contrafortes da Mata Branca, onde tendo a contribuição dessas e outras táticas, conseguiu permanecer por quase longos vinte anos assombrando o sertão nordestino. Porém, como tudo nessa vida tem seu início, meio e fim, na segunda metade da década de 1920, o cangaço começa a sofrer tombos que algum tempo depois o leva ao clímax, ao epílogo de uma era sangrenta, dolorosa e enlutada para os sertanejos.
Os anos considerados mais gloriosos das ações cangaceiras estão entre 1919 e 1927, já na fase do cangaço lampiônico, mesmo haverem, na época, mais de 40 bandos com chefes distintos nos sertões dos Estados nordestinos, o comandado por Lampião destaca-se notoriamente, apesar de entre os anos de 1921 e 1922 a Força Pública pernambucana ter sido uma ‘pedra nas Xô-boi’ dos bandos na região do Pajeú das Flores. Até fins de 1926 e início de 1927 os cangaceiros tinham um ‘aliado’ bastante benéfico: era que as tropas militares em perseguição aos bandos de cangaceiros não podiam transpor as divisas de Estado, legalmente, dando continuação a uma perseguição.
Eurico de Souza Leão |
No plano colaborado pelo “Rifle de Ouro” determinam-se focar as investigações e ações militares na malha colaboradora, roceiros, vaqueiros, militares, fazendeiros, comerciantes e etc.. Até aquele momento todas as tentativas de combaterem o banditismo rural focava-se diretamente em sua figura maior, Lampião. Silvino, tendo sido chefe cangaceiro, sabia que dentro da ‘malha’ de colaboradores existiam aqueles que serviam de ‘pombos-correios’, servindo quase que exclusivamente para levar e trazer recados, notícias e etc.. A coisa estava tão séria que mesmo antes de uma ordem direta para determinado comandante de volante chegar ao mesmo, Lampião já estava ciente da mesma.
Com isso tinha tempo para organizar uma emboscada ou mesmo mudar totalmente sua direção apagando seus sinais. Podemos concluir que a partir daí inicia-se o começo do fim do Fenômeno Social. Logicamente, devido a inúmeros obstáculos surgidos, como por exemplo, uma extensão territorial enorme, colaboradores na alta sociedade e militares de alta patente, leva-se mais de 10 anos para terem o resultado final, para que o laço fosse se fechando objetivando a extinção do Cangaço.
Uma das decisões principais para que se desse fim ao movimento social cangaço, a nosso ver, foi à admissão de sertanejos nas colunas militares perseguidoras. A ‘matéria prima’ para formar-se um cangaceiro era um vaqueiro, um roceiro, um sertanejo nato, homem disposto, sem medrar a nada, nem mesmo a morte, estava pronto para tudo. Além disso, fora forjado em um ambiente duro, cruel, sentindo na pele a selvageria causada pelos homens dos ‘coronéis’ em seus familiares, amigos e conhecidos. Então, quando da decisão de nomear homens do sertão, vaqueiros, roceiros e sertanejos natos, a coisa começou a ficar equilibrada. Havia homens de mesmo ‘quilate’ de ambos os lados e todos eram conhecedores dos perigos da caatinga. Vestimentas, calçados e coragem agora estavam equidistantes. Os comandantes militares locados em diversas cidades interioranas tiveram a ordem de admitir aquele que quisesse fazer parte da Força Pública, aqueles que quisessem ser contratados e ainda de aceitarem a ajuda daqueles que se fizessem voluntários, por ‘n’ motivos, para darem combate aos cangaceiros. Aí passou a ser “cobra engolindo cobra”.
Lampião, em princípios de 1926 é convocado para fazer parte do Batalhão Patriótico, medida tomada pelo Governo Federal com o intuito de dar combate a “Coluna Prestes” em vários Estados da Nação, situado na cidade de Juazeiro do Norte, CE. Virgolino recebe a patente de Capitão Provisório dos Batalhões Patrióticos, consequentemente, seu Estado-Maior também recebe suas devidas divisas militares. Além disso, a agora ‘tropa militar’, recebe dinheiro, uniformes e equipamento bélico de alta precisão para a época. O bando de Lampião torna-se tão forte que em novembro daquele mesmo ano, no local chamado Serra Grande, no município de Calumbi, PE, causa a maior derrota até hoje registrada a Polícia Militar de Pernambuco. Porém, essa vitória deixa o chefe mor do cangaço bastante afoito, fugindo notadamente de sua maneira de agir, e no primeiro meado do ano seguinte sofre grande derrota em terras potiguares.
Fugindo com o rabo entre as pernas, o bando do “Rei Cego” a cada investida das Forças Públicas de vários Estados vai diminuindo rapidamente. Tanto que no segundo meado de 1928, contando apenas com cinco homens, migra para terras baianas onde remonta seu império do terror. A maneira de Virgolino agir, suas táticas empregadas, sempre chamou atenção até entre seus perseguidores e inimigos. Sempre planejando antes de agir, causa grandes baixas nas fileiras das colunas militares que sai em sua perseguição.
Logicamente não se tratava apenas de táticas no campo de batalha, também havia aquela usada junto aos colaboradores, principalmente aqueles que tinham o dever de persegui-lo.
Ficando um bom tempo na ‘moita’, Lampião começa a conquistar os baianos. Aos poucos vai recrutando e aumentando, novamente, o contingente de seus asseclas. Porém, Lampião depois de algum tempo, sai da Bahia e vai instalar-se em terras sergipanas, ficando o território baiano como zona de ataques periódicos. No início dos anos 1930, “O Cocho” toma uma decisão fantástica em termos de guerrilha: divide seu bando em pequenos grupos e cada grupo com seus respectivos chefes. Com isso as Forças perseguidoras ficam um tanto desbaratinadas sem saberem ao certo quando, realmente, estavam dando combate ao cangaceiro mor do Pajeú das Flores. Essa ação deixa até os jornais, meio único de comunicação em massa na época, desnorteados e, automaticamente, seus leitores. Há, nos arquivos de vários periódicos, ações noticiadas de em um mesmo dia, em cidades distintas e longe uma da outra, praticadas pelo “Rei do Cangaço”. Quando na verdade eram praticadas por asseclas daqueles pequenos grupos.
Após as pancadas que levou no lombo no decorrer da década de 1920, seu primeiro decênio de reinado, o terceiro filho de José Ferreira já no envelhecer do corpo físico, mantem-se mais nos acampamentos. Entre fins de 1936 e início de 1937 até meados de 1938, quando de sua morte, Lampião passou a comandar diferentemente seus cabras. Nessa fase, o “Rei Cego” passa quase que exclusivamente a executar os famosos bilhetes de extorsão e enviar cangaceiros e coiteiros de confiança para que trouxessem mantimentos, armas e munição. O chefe cangaceiro distribui entre a população, nessa época, seu ‘passaporte’ de livre passagem. Para se transitar pelo sertão fazia-se necessário pagar um percentual ao neto predileto de dona Jacoza, ou corria o risco de enfrentar a boca de um fuzil ou a ponta de um punhal. E não eram apenas os ‘pequenos’ que sofriam de imposição, os grandes produtores, industriais, fazendeiros e latifundiários também faziam parte das ‘colaborações’.
“(...) No atacado, no plano dos grossos capitais, houve o caso exemplar da fábrica de tecidos da Pedra, em Alagoas, cujo caminhão somente teve a jornada diária garantida, as cargas não mais deixando de atingir a ponta do trilho da Great Western em Rio Branco, (Arcoverde) Pernambuco, a cada dia, quando o gerente, José Borba, despiu-se dos escrúpulos e sentou à mesa discretamente com Lampião, lá mesmo na vila alvíssima do finado coronel Delmiro Gouveia, em meio a goles de uísque. Onerada a folha da empresa em um conto de réis por mês, o sossego fez-se total. Negócio bom é o que interessa a ambos os lados, devem ter pensado industrial e cangaceiro (...).” (MELLO, pg 251, 2012)
Alguns jornais começam a prestar um serviço digno para a população e com isso começa a ‘balançar’ o poder daqueles que tinham as ‘rédeas do poder nas mãos’. Outros, pensando apenas em vender seu produto, até inventar inventam notícias sobre o que ocorria nos sertões dos Estados: na aurora de 1938 o jornal Diário de Notícias, da cidade soteropolitana, Capital do Estado da Bahia, noticia a morte de Virgolino Ferreira. O cangaceiro mor teria morrido vítima de tuberculose em sua própria cama. Hoje podemos até darmos risadas de uma notícia dessas, porém, naquele tempo as coisas eram por demais sérias, tanto que a notícia é postada pelo jornal nova-iorquino New York Times, onde disse: “O fora da lei número um morre em sua cama, no Brasil”. (MELLO, pg 270, 2012)
De uma ou de outra forma os Jornais levaram as informações ao público. Em fim, prestando excelentes serviços. Tanto que a população dos grandes centros urbanos começa a exigir mais e eficientes ações das autoridades. Alguns vespertinos, já tendo o povão ao seu lado, começam a ‘apertar’ o nó de cânhamo no gogó de alguns chefes militares envolvidos diretamente com as ações no combate ao banditismo rural. Nas Alagoas o alvo é diretamente o comandante do II Batalhão, major, na época, José Lucena de Albuquerque, em Pernambuco a coisa recai no lombo do tenente Luís Mariano da Cruz, ‘sucessor’ de Manoel de Souza Neto que havia deixada a Força Volante voluntariamente em janeiro de 1936.
O oficial pernambucano, tenente Luís Mariano, natural do município de São José de Belmonte, PE, é tido como um dos grandes e valorosos oficiais que deram combate aos cangaceiros. O comandante pernambucano, sendo entrevistado por um repórter do Diário de Pernambuco em fins de 1937, diz: “Lampião faz uso dos seus retratos como salvo-conduto, que ele autentica com sua firma e entrega às pessoas que lhe pagam determinado tributo e ao grupo, e que lhes prestam completa lealdade e obediência (...) nesses últimos tempos, tem-se embrenhado nas caatingas do Estado de Sergipe e se demora principalmente nos município de Porto da Folha, Simão Dias, Aquibadã, Gararu e Frei Paulo, sendo nesse último município que o bandido-chefe fez, com certa segurança, o seu quartel-general.
De quando em vez, Lampião, à frente de uma parte de seu grupo, invade a Bahia, entrando ali pelos municípios de Jeremoabo, Cícero Dantas e Paripiranga, que separam os Estados da Bahia e Sergipe. Nessas excursões, pratica grandes roubos e depredações, e retorna aos lugares que lhes servem de coito, onde descansa por meses oculto, guardado por coiteiros de sua absoluta confiança(...).”
Já o periódico “Gazeta de Alagoas”, em sua edição de 9 de julho de 1937, usando um pseudônimo chamado de “Sertanejo”, ataca diretamente o comandante do II Batalhão localizado em Santana do Ipanema, AL, “... alguma de lamentável venha ocorrendo no policiamento feito por alguma volante”, cobrando-lhe, antes e depois, maiores resultados nas ações contra o banditismo. Passa-se mais de trinta dias para que o major Lucena desse uma resposta, em 5 de agosto daquele ano, jogando toda a culpa nas costas dos coiteiros: “... se encontram naturalmente nos coitos, amparados e recebendo munições(...) de modo algum prestam auxílio à polícia.” Citando ainda que as Forças de Combate “trabalham com uma única esperança: a casualidade”. O comandante Lucena se ver tão apertado que se dirige diretamente, através de um boletim/telegrama, ao comandante-geral coronel Teodureto Camargo do Nascimento o qual o jornal Folha de Maceió consegue e o publica, na íntegra, em sua edição do dia 13 de agosto de 1937:
comandante Teodoreto Camargo do Nascimento
“Sipanema – Pls. 93-91, data 11, Hora 11h10, Cel. Teodureto – Reg. Policial Militar, Maceió
Estou posse recorte jornais contendo acusações ação força contra banditismo. Não me admiro isto parta Mata Grande, onde há maiores coitos bandoleiros. Vislumbro bem quais responsáveis artigos, os quais, antes 1930, acoitavam cangaceiros e hoje, mais criminosamente ainda, o fazem. Tais autores deviam, antes de mentir, se preocuparem com misérias deles próprios. Fique pois, digno comandante, tranquilo que saberei cumprir meu dever. Vou responder artigos jornais, pois estou disposto aceitar luta. Saudações – José Lucena de Albuquerque Maranhão, major comandante II Batalhão.” (MELLO, pg 260. 2012)
Depois dessa postagem da “Folha de Maceió”, o “Sertanejo”, através das páginas da “Gazeta de Alagoas”, compra a briga definitivamente e desce o ‘cacete’ no comandante do II Batalhão. Em 18 de agosto, dirigindo-se diretamente a José Lucena, diz: “devia estar em Mata Grande, com seu trabalho, não em Santana do Ipanema”. Referi ainda sobre os criminosos citados pelo major, “criminosos de antes ou de depois de 1930, que tudo seja apurado!”.
Rapaz, depois dessa Lucena fica vendo as saídas se fechando. Apertado, redige imensa carta e envia-a ao jornal que a posta no dia 21 do mês. Nessa carta o major tenta argumentar sobre uma ‘possível’ colaboração de seus subordinados aos cangaceiros: “...quem luta com quatrocentas naturezas espalhadas em todo sertão, por mais que seja rigoroso será surpreendido, vez por outra, com irregularidades de subordinados”. Para nós, há uma concordância em que alguém da corporação, ou mesmo alguns militares, colaboravam com os cangaceiros. O rebu é grande e a população fica na expectativa das providências que serão tomadas pelas autoridades. Porém, só em outubro é que o governador de Alagoas, Osman Loureiro, lança na Gazeta de Alagoas sua determinação de que o II Batalhão permanecerá em Santana do Ipanema.
No dia 11 de novembro daquele ano, Getúlio Vargas, através do Decreto nº 19.398, dissolve o Congresso e dá um golpe no regime que o colocou no Palácio do Catete, implantando uma Ditadura, O Estado Novo. São criadas as Delegacias de Ordem Política e Social, linha dura, e é decretada a pena de morte gerando grande impasse nos redutos advocacionais. O Decreto-Lei 88, sobre a novíssima LSN, Lei de Segurança Nacional, em seu Arti. 122, inciso 13, alínea f, rezava claramente que seriam tomadas medidas radicais no “homicídio cometido por motivo fútil ou com extremos de perversidade”. Logicamente esses termos eram dirigidos para aqueles contrários ao Novo Regime e aos bandos de cangaceiros e seus colaboradores, nunca para as perversidades praticadas pelas volantes. O sociólogo Frederico Pernambucano de Mello, diz a respeito: “parecendo mirar o dia a dia dos cangaceiros e de seus protetores. Carapuça certeira. Cabia o alarme entre chefes políticos do sertão. Entre os favorecedores mais eficientes do cangaço, incorrigíveis até ali”.
No início de 1938, o major José Lucena, comandante do II Batalhão em Santana do Ipanema, AL, é convocado para comparecer urgentemente a presença do coronel Teodureto na Capital do Estado:
“(...) o coronel Teodureto ansiava por ter com ele uma conversa reservada, com vistas a “identificar o dedo misterioso que incidia sobre o contexto da campanha (contra o cangaço) e levava àquele resultado deplorável”. Homem enérgico, embora polido, como se impõe a um oficial superior do Exército, Teodureto abre a fala ressalvando “que não punha em dúvida a lealdade e a competência do seu subordinado, mas que precisava descobrir a causa da frustração e eliminá-la custasse o que custasse”. E porque “cumpria restaurar a confiança das populações massacradas pelo cangaço nas providências de governo”, pontuava palavra por palavra, “não abriria mão, a partir de agora, de ação efetiva e ajustada, sob pena de apelar para medidas drásticas e até arbitrárias contra aqueles que fossem apanhados violando suas determinações”. Lucena pouco fala. Ao fazê-lo, já no final, somente lhe acode rememorar o que dissera à imprensa na polêmica de meses atrás: que lhe parecia impossível garantir a honradez de cada uma das quatrocentas individualidades que comandava no sertão. E deixa o Regimento policial “tão amargurado, que ruma dali para a catedral, a fim de orar e pedir a Deus ânimo e luzes para se safar do sério embaraço em que se via metido”. (MELLO,pgs 268 a 269. 2012)
A partir daí, já vinda desde o Palácio do Catete, a ordem de acabar com Lampião vai passando de esfera em esfera de comando. Cada um que passasse a batata quente para as mãos do seu subordinado imediato. As autoridades lançam panfletos deixando a população ciente de que suas ações tinham carta branca, ou seja, podiam usar as ações que quisessem que o Estado os protegiam. Ocorre uma ruma de gente que deixa seus lugares onde moram e caem no mundo. Outros, já da alta, mudam de lado e começam a serem colaboradores das volantes, outros, porém, não deu tempo e são trancafiados. Mesmo assim alguns gatos pingados, devidos à grana ser alta, permanecem colaborando com Lampião, não outro chefe, apenas ao “Rei dos Cangaceiros”.
Entre os cangaceiros, também há deserções, pois sabiam que o cerco se fechava cada vez mais.
Lampião e Jurity em foto de Abrahão
Aqueles que fizeram parte das fileiras cangaceiras não tinham nenhum compromisso com seus companheiros. Ninguém era por ninguém e cada um que defendesse sua vida particularmente. O respeito e a solidariedade entre eles se baseavam em valores financeiros. Se qualquer um deles tivesse tido a oportunidade de matar o cangaceiro mor, Lampião, para apossar-se de seus ‘bens’, da grana e valores em joias e ouro que levava consigo, com certeza o teria matado. Excetuando-se, logicamente, algumas personagens como Luiz Pedro, na ocasião de sua morte, um Mariano anteriormente, um Gato, Sabino e etc... O cangaço estava prestes a acabar.
Fonte: Lampiao aceso.
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