DE TIO PARA SOBRINHO
A memória de Joquinha Gonzaga está cheia de retratos não tirados e objetos não guardados. O sobrinho de Luiz Gonzaga nasceu no núcleo nordestino que o tio construiu no Rio de janeiro,lugar onde remontou uma realidade sertaneja,muito parecida com a de Exu. Tudo isso para ter os familiares por perto. Mesmo tendo vivido toda infância e adolescência ao lado de Gonzagão, Joquinha nunca se preocupou de guardar nada material. Achava que o tio ia ficar para sempre. A trajetória do sobrinho está completamente entrelaçada à de Luiz. E muito antes de vir ao mundo. Do lugar onde nasceu à escolha da sua profissão. desde quando ganhou seus primeiros trocados,Gonzagão planejou levar toda familía para o Rio de Janeiro. E assim fez. Logo que pode,levou Santana e Januário,seus pais, e as quatro irmãs para viverem perto dele.Doido que os parentes ficassem,Luiz Gonzaga resolveu o problema.Adaptou a realidade aos seus conterrâneos. Comprou uma casa em Duque de caxias,em um lugar chamado Santa Cruz da Serra. E os sertanejos lá prepararam a terra,começaram a plantar,criar animais e viver a vida como gostavam. " Quem for se casando,eu vou dando um pedaço de terra " prometeu o artista as irmãs. E a primeira que se casou foi Muniz. E o primeiro a nascer foi João Januário de Maciel,Joquinha. Ali conviveram irmãos ,primos,tios e avós.Casando e morando lado a lado,numa grande vida em comunidade,em família. " Foi na fazenda,no Rio de janeiro,onde eu comecei a viver o nordeste ", conta Joquinha, lembrando da fase da qual sente muitas saudades. Dos tempos difíceis de Exu, o sobrinho mais velho de Gonzagão só ouviu falar. Viveu uma infância pacata no Rio de Janeiro.
"Tio Gonzaga era uma pessoa perfeita.Fez o possivel para adquar sua vida como artista a de um cidadão comum ",conta Joquinha. " E não tinha ganância.Vivia da música.Tinha um coração enorme". O engraçado,para joquinha,é que,o hoje mítico Luiz Gonzaga,era apenas seu tio. Por isso mesmo,nem ele nem ninguém da familia se preocupava em guardar nada dele. Nem retrato,nem objetos. " A gente só atentou para isso depois que ele faleceu."
Gonzaga no auge da carreira,viajava muito. Passava meses fora,mas sempre voltava para Santa Cruz da Serra para visitar as irmãs. Levava não só noticias do Exu,mas também pequi,carne de sol,bode seco,feijão de corda,e fazia farras tocando sanfona e contando história. Vez ou outra,levava também algum conterrâneo para visitar e comer buchada e galinha de capoeira.Dominguinhoa,Trio Nordestino,Marinês,Jackson do Pandeiro,Noca do Acordeon tocava forró no Rio de janeiro como se fosse em Pernambuco. foi naquele núcleo nordestino-carioca que nasceu e se criou Joquinha.Estudando,tinha pouco interesse pela tradição familiar da música. Mas um dia,perto dos 14 anos,o tio chegou com uma sanfoninha de presente. " Eu penso que ele achou que eu tinha cara de sanfoneiro e me escolheu. Aí me deu uma sanfona de oito baixos. E eu comecei a tocar",Conta.
Um ano depois, Joquinha já desenrolva bem a sanfona. E ganhou do tio um acordeon. Foi aprendendo cada vez mais,até nascer como sanfoneiro. Mais um na família. O único dos sobrinhos. A partir daí,todas as vezes que Gonzaga ia dar um presente uma sanfona a alguém,primeiro perguntava se Joquinha queria trocar. " Se você gosta mais dessa do que da sua,pode ficar pra você ", dizia Lua.
"Aprendi vivendo. Tio Gonzaga me ensinando,me puxando,me cobrando e procurando me orientar.E depois que ele notou que eu tava tocando,ele começou a me levar pros shows ". Foi só após de servir quatro anos no exército que Joquinha entrou mesmo no circuito. A primeira viagem oficial com o tio foi em 1975,aos 23 anos. Joquinha era chamado para um momento de show de Luiz.
Mas em 1989 Tio Gonzaga se foi e ele ficou. Como representante da família, o sobrinho procura fazer aquilo que o tio ensinou. Há 16 anos,tomou a decisão de morar no Exu. Uma forma também de continuar conectado com a tradição. " Tenho um carinho muito grande poe essa terra que foi tão cantada pelo meu tio. É daqui que eu venho.Gosto do sertão,do povo,da maneira que o povo vive aqui. E aqui vou ficando..."
Assim como Joquinha,um dos seus filho parece ter tido um destino traçado antes de nascer. Luiz Januário,de 6 anos,dorme ao som de um mantra recitado pelo pai: "Você vai ser sanfoneiro,você vai ser sanfoneiro". " Já comprei até uma sanfona. Tá danado de ele não ser ",brinca, E quando alguém pergunta a Luiz Januário sobre seu futuro,ele responde sem dúvida: " Eu quero ser baterista."
"Que baterista ,filho da égua ? Você tem que ser sanfoneiro ",debocha o pai.
Por Chico Ludermir
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