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Não há, em todo o Largo da Bomba do Hemetério, Zona Norte do Recife, quem não saiba apontar o caminho para a casa do Maestro Forró. Aos 41 anos, o músico mudou de endereço uma única vez, para duplex construído na mesma rua onde nasceu e foi criado pelos pais, a professora aposentada Maria da Penha e o artista popular Zé Amâncio do Coco, dos quais é vizinho.
Homenageado do Carnaval do Recife deste ano, vivendo o que considera seu melhor momento, ele até gosta quando lhe perguntam se planeja deixar a comunidade ou mesmo o país: “Nunca cogitei.” Orgulhoso, reforça que vem, ao contrário, fortalecendo as raízes, com novo CD e episódios inéditos do programa Andante (estreia dele na televisão), previstos para serem lançados ainda neste semestre. Ambos, como todos os projetos concebidos por ele, nasceram no terraço de casa.
Foi na Bomba que Francisco Amâncio da Silva, nome registrado nos documentos, absorveu as primeiras influências musicais. “Desde a infância, vejo a comunidade ferver com ritmos distintos em harmonia. A periferia é assim. Enquanto um coral se apresenta na igreja, os toques da umbanda soam mais à frente, com ecos de ensaios do coco, dos caboclinhos e dos maracatus”, conta o instrumentista. Filho de mestre do coco e irmão de pianista erudito, aos cinco anos de idade ele já tocava zabumba. Na adolescência, teve as primeiras aulas de música na Escola de Referência em Ensino Médio Dom Vital, em Casa Amarela. É para essa fase que a memória aponta quando o Maestro Forró busca a gênese do que se tornou sua missão: eruditizar o popular e popularizar o erudito.
Maestro Forró recebeu o apelido numa festa junina. Foto: Ricardo Fernandes/DP |
Do professor de música Tenório, Francisco Amâncio recebeu o apelido de “Forró”, aos 12 anos - quando, numa festa junina, foi o único a apresentar canções de nomes tradicionais como Azulão e Luiz Gonzaga, enquanto os colegas cantavam lambada, moda nos anos 1980. Do mestre paraibano Naílson Simões, recebeu as primeiras lições de trompete. Ao designer pernambucano de calçados Jailson Marcos, encomendou as sandálias com as quais sobe ao palco, sempre vestindo bermuda e camisa de botão. E, assim, surgiu o personagem Maestro Forró. “Faça sol ou chuva, seja dia ou noite, o Maestro Forró usa sempre óculos escuros. É o principal adereço do personagem, criado para desburocratizar e desmitificar a figura do maestro”, explica o músico.
Há 14 anos à frente da Orquestra Popular da Bomba do Hemetério, criada por ele como desdobramento da Escola Comunitária de Música da Bomba do Hemetério - coordenada pessoalmente até hoje -, Maestro Forró rege 21 músicos e seis técnicos em palcos do Brasil e do exterior. Todos são moradores da comunidade onde vive o regente. “Não queremos ser somente frevo, nem somente mangue, nem maracatu. Não queremos ser bregas, nem chiques. Apesar das inúmeras referências, criamos algo único, sem rótulo. Somos nossa própria raiz.”
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“Para o Baile Municipal, no próximo dia 30, convidei Lenine, Geraldinho Lins e Gerlane Lops para homenagear comigo Chico Science, que neste ano faria 50 anos, e lembrar os 40 anos da morte de Nelson Ferreira. No show de abertura do Carnaval do Recife, no dia 5 de fevereiro, no Marco Zero, recebo no palco Lenine, Naná Vasconcelos, Cannibal, Fred 04, Lirinha, Chico César, Otto, Johnny Hooker, Luiza Possi e o Maracatu Nação Pernambuco. Serão duas horas de show.”
“Não se pode falar nem usar a palavra ‘mercado’, que logo mencionam a Bahia, a proteção de mercado, a dominação do sertanejo… Penso que tudo que tem qualidade requer trabalho. Fazer sucesso e se manter no mercado requer trabalho. Essas pessoas estão trabalhando. Eu também. É preciso reduzir a qualidade musical para penetrar o mercado? Na minha opinião, não. Só se pode viajar em turnê com número reduzido de músicos? Também não. Embarco muitas vezes com a orquestra inteira. Quero continuar disseminando o frevo, o maracatu, o nosso folclore pelo mercado.”
“Com a estreia da primeira temporada do Andante na tevê aberta (Rede Globo), em dezembro, falei sobre minha relação com a Bomba do Hemetério. Os outros nove episódios foram gravados na Turquia, na Bulgária e na Romênia. A segunda temporada está sendo finalizada e foi gravada em Cuba. O programa, dirigido por Alessandro Guedes, trata das semelhanças culturais entre os povos. Os cânticos mulçumanos, por exemplo, lembram o aboio nordestino. Os temperos do Leste europeu são iguais aos nossos. Todos somos muito parecidos.”
“Desenvolvemos, há dez anos, o projeto Fole Assoprado, que neste ano será transformado em disco homônimo, em comemoração a essa década na estrada. Fazemos turnês pelo país, principalmente no período junino, tocando forró sem sanfona. Escrevi os arranjos para que os metais substituam a sanfona. As pessoas nem percebem. Nesse projeto, me apresento vestido de Lampião, e os músicos da orquestra, de personagens das quadrilhas juninas. Parte do repertório é autoral, parte é releitura de Gonzaga, Sivuca e outros mestres.”
Fonte: DP
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