quinta-feira, 21 de abril de 2011

                                                           

                                PENITENTES DE JUAZEIRO DA BAHIA

         Uma das mais fortes manifestações do período da Quaresma resiste ao longo de mais de dois séculos no Sertão do São Francisco. Durante os 40 dias que antecedem a comemoração da ressurreição de Jesus Cristo, Domingo de Páscoa, um grupo de católicos do município procura formas surpreendentes para manter a tradição, do jejum à autoflagelação. A cada ano, o ritual se renova em torno de dois grupos conhecidos por Cordões das Alimentadeiras das Almas e os Disciplinadores, que fazem procissões distintas e se encontram no cemitério para rezar pelas “almas perdidas”.
Os rituais acontecem às segundas, quartas e sexta-feiras, a partir da meia-noite, quando homens e mulheres vestidos em lençóis brancos, formam longas filas indianas e seguem pelas ruas que dão acesso ao cemitério. Em vez de um andor com uma imagem sacra, os penitentes carregam uma cruz gigante na frente, marcando a rota da caminhada. Todos obedecem ao badalo exótico de uma matraca (instrumento de madeira que emite um som estridente).
De acordo com a professora e folclorista Maria Izabel Figueredo, estudiosa sobre o assunto, há indícios de que a peregrinação dos penitentes tenha se iniciado em 1710, quando os frades franciscanos que viviam no Vale do São Francisco evangelizavam as comunidades da região. “A partir disso, as futuras gerações foram resgatando os costumes marcados pela fé e religiosidade”, comenta a professora. Ela aponta que, no passado, o jejum era tido como único meio para se redimir dos pecados e conveter-se a Deus. Mas a penitência se tornou o mais doloroso modo de pagar os pecados.
A folclorista informa que os disciplinadores praticam a autoflagelação com a missão de derramar o próprio sangue em honra à Paixão de Cristo. A partir da meia-noite, apenas os homens – que preferem manter a identidade preservada e não aceitam conceder entrevistas – entram no cemitério e praticam a autoflagelação. Eles evitam a presença de estranhos. Sem camisa, usam lâminas afiadas presas à ponta de uma corda de couro e açoitam as próprias costas, sem se importar com as dores ou sangue derramado.
Para Izabel Figuerdedo, que além de estudar a tradição acompanha há vários anos a saga dos penitentes, os atos cometidos por eles podem ser comparados aos da Idade Média, “Período em que o homem vivia sob o temor da luta entre o bem e o mal, da salvação ou danação eterna”, lembra.

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