sábado, 9 de fevereiro de 2013

Foto: Carnaval PE 2013 | Olinda

Mergulhe... (por Joana Pires)

O CARNAVAL EM PESSOA
Ou como um homem arrebata, à meia-noite, milhares de corações

Não há quem se recupere fácil de um amor de Carnaval. Não aquele dos beijos trocados a cada ladeira de Olinda, mas o do encontro de dois, que se torna quase epifania, momento de suspensão do que se passa ao redor. É como bater os olhos e viver uma história de amor que interrompe a vida por um momento e provoca memórias rememoradas durante anos. O impacto do amor de Carnaval é quase o de uma tatuagem feita em embriaguez, de bebida, de música, de alegria.
Em Olinda, ali perto da Rua do Bonsucesso, a caminho da Rua do Amparo, isso acontece, no mínimo, todo início de Carnaval, na madrugada em que o Sábado de Zé Pereira abre alas para o domingo da grande festa, com a saída do aguardado Homem da Meia Noite. O bloco, que carrega, sem dúvida, os foliões mais apaixonados pela cidade histórica, existe há 81 anos, mas seu impacto se faz renascer anualmente no coração de quem vê o calunga sair pela primeira vez. Porque o Homem da Meia Noite não é como um boneco gigante comum, mas uma manifestação nascida no mesmo dia de Iemanjá e carregada do mistério que as religiões africanas trouxeram para o Brasil.
Lembro que, em 2010, lá estava eu, em uma calçada do Amparo à espera do calunga, tentando dimensionar de onde vinha todo aquele amor, o que fazia todas aquelas pessoas esperarem por tantas horas, varando a noite – momento em que Olinda se torna um lugar não muito afável com os foliões, sejam eles locais ou de terras distantes. Hoje, três anos depois, percorro suas ruas em busca de uma resposta, dos depoimentos e das confissões dos amantes de longa data do boneco que se tornou a marca do nosso Carnaval.
A primeira visita que fiz foi ao ateliê de Tereza Costa Rêgo, uma das artistas plásticas pernambucanas mais consagradas. Lá, logo fui recebida por Gilda Barros Costa Rêgo, uma cadela da raça West Highland White Terrier que me fez companhia enquanto eu aguardava o momento da entrevista.
Tereza se considera namorada do Homem da Meia Noite. “Todos os anos, ela escreve uma carta declarando o amor que sente pelo calunga”, comenta Luiz Adolpho, atual presidente do bloco. “Junto com a declaração, ela sempre coloca uma quantia simbólica, uma doação, e diz: é pro meu homem tomar cerveja”, completa o presidente, quase como uma testemunha do romance.
Do sofá na sala, vejo a sombra dela refletida na parede da escada de ferro em espiral, caminhando de um lado para outro no primeiro andar, num mistério que me lembra o outro encontro que vivi no meio daquela mesma rua de Olinda. De um show no Fortim, peguei um táxi em direção ao Recife, interrompido já na Praça do Carmo por uma vontade imensa de ver o Homem da Meia Noite pela primeira vez. Dali até o calunga passar, foram quase três horas de espera, acompanhando a Cidade Alta se transformar. 
De um lugar de calor, “suor e cerveja” para uma noite pesada, em que a alegria cedia espaço à vontade desmedida, à vontade de enfrentar as aventuras que vinham. Fiquei e esperei ansiosamente, como milhares de outras pessoas faziam – mulheres, homens, crianças, idosos, gente tão diferente uma da outra que só o Carnaval era capaz de juntar. 
O Homem vinha, mas nunca chegava. E dali do lado da Igreja do Amparo, a gente só ouvia os fogos e via a multidão passar enlouquecida; a polícia dura; os bêbados, desatentos. Numa determinada hora, todos os comerciantes fecharam suas barracas de cerveja e espetinho, e o espaço de convivência diminuía como que anunciando a confusão. Nunca pensei que Olinda podia, ao invés de ir esvaziando com o passar do dia, ir enchendo de gente e perdendo espaço. E quanto mais noite era, mais impossível o meu objetivo se tornava. 
Entre a decisão de ir embora ou ficar, fiquei, mas só decidi mesmo no momento em que vi o boneco de perto pela primeira vez. De pé na esquina da rua, eu tentava me aproximar e ver o que parecia encantar todas aquelas pessoas ali no meio da rua, paradas num empurra-empurra impossível. No muro da casa à minha diagonal direita, uma sombra refletia toda a silhueta do calunga, ajudando na preparação dos que, como eu, têm coração mole. E a sensação era de que o próprio tempo tinha dado uma paradinha em respeito à passagem daquele senhor tão distinto.
O momento em que o Homem da Meia Noite aparece no meio das ladeiras e ruas sinuosas de Olinda é, efetivamente, um momento de entendimento do Carnaval. Como se naquele pedaço de tempo, toda a loucura que a folia introduz na nossa vida tomasse corpo, fizesse certo sentido. É como se, diante do calunga, a gente encontrasse o Carnaval em corpo de boneco e entidade, o Carnaval em pessoa. Não sei se todo mundo é capaz de sentir, mas sei que quem sente nunca esquece. É como ser batizado para um rito profano. 
UM HOMEM CHEIO DE AMANTES
“A saída do Homem da Meia Noite é algo diferente. O bairro todo fica em função dele, as pessoas vão buscá-lo na sede”, comenta Tereza Costa Rêgo, já sentada ao meu lado, no sofá da sua casa. O sorriso dela, vale dizer, brilha, reluzindo a paixão pelo boneco. “Eu falo isso, mas é isso que eu sinto de verdade: ele é meu namorado”, conta entre risadas. 
O romance dos dois começou em 1979, momento em que Tereza voltava ao Brasil após ter sido exilada por conta da ditadura. Era o ano da anistia política e ela retornava ao País com o marido, Diógenes Arruda. Os dois eram membros do PC do B e voltavam da França quando, na chegada em São Paulo, Diógenes sofreu um enfarte fulminante e faleceu na saída do aeroporto. 
“Este foi o momento de uma tristeza profunda e, vindo pra Pernambuco, me instalei em Olinda, nessa mesma casa em que vivo hoje. A casa era um vão, não tinha janela, não tinha nada. Mas de lá de dentro ouvi os clarins anunciando a passagem de um bloco. Corri para a calçada e quando abri a porta, dei de cara com o Homem da Meia Noite, sorrindo na minha frente”, comenta. “Nessa hora pensei: perdi o marido, mas achei um namorado”.
Ela sabe, na verdade, que não é a única namorada do calunga. Ao longo desses mais de 80 anos, o Homem da Meia Noite já colecionou muitas paixões. Até seu nascimento, dizem por aí, tem ligação com as conquistas amorosas de um homem galante. Conta Seu Neo e Dona Irene, filhos de Benedito Bernadino, um dos fundadores do bloco, que a inspiração para a sua criação veio justamente de seu pai, que via, todos os sábados, um homem misterioso, elegante, carregando chapéu e vestindo casaca, passar à meia-noite seguindo sempre o mesmo caminho. Certo dia, Seu Benedito, curioso, resolveu segui-lo e constatou que o homem era um “Don Juan”, que pulava janelas de sobrados e conquistava as donzelas de Olinda. Não se sabe até hoje se a história é real, mas não há quem duvide ao ver, nos sábados de Carnaval, a casa verde de Seu Neo e Dona Irene apinhada de tanta gente apaixonada, aguardando com ansiedade a saída do boneco.
Dona Elma, que mora em outra casa verde a três casas da sede do bloco, conta da paixão do pai, Seu Isná de Luna, outro integrante do grupo de fundadores. “Ele amava o bloco. Passou um período em que o boneco saía da sede e já seguia pra Olinda, sem vir por esse lado de casa. Meu pai chorava, entristecido”, conta Dona Elma, com as mãos trêmulas de emoção. Hoje com 70 anos, ela lembra com carinho dos anos que viu o pai dedicar ao Homem da Meia Noite. “Durante o ano todo, a gente só saía se fosse com ele, sozinha não podia. Mas no Carnaval, ele deixava a gente sair com mãe e brincar sem problema”. Era o momento de permissão da felicidade. 
Nascida e criada na mesma casa da Rua do Bonsucesso, hoje ela acha que o bloco tem se tornado difícil de ver. “A multidão é muito grande e pra ver tenho que enfrentar a calçada, mas nunca deixei de brincar”, comenta. “Eu amo o Homem da Meia Noite”. 
“É um bloco difícil, porque é uma explosão de gente. Já passei pela sensação de ser esmagada na parede pela multidão que o acompanha”, conta a artista plástica Isa do Amparo, outra vizinha da sede do bloco. “Ainda pesquiso qual o elo de energia que faz o povo subir a ladeira para ver esse homem”, comenta.
Ela, que é baiana, mas já vive em Olinda há 32 anos, lembra que se mudou para a Cidade Alta numa sexta de Carnaval. “Mudei para essa casa ainda em obras, minha mobília ia passando junto com o Elefantes [o bloco]”. Desde então, Isa é apaixonada pela festa de Olinda e construiu uma “relação íntima” com o calunga. “Até roupa pra ele eu ajudei a fazer”, conta orgulhosa.
Ela, como Tereza, foi homenageada pelo bloco em 2012, na comemoração dos 80 anos do calunga. “Isso pra mim foi como uma confirmação de que eu sou olindense”. Isa veio para Olinda também de mãos dadas com um grande amor, um artista plástico pernambucano que ela conheceu numa Bienal de Arte da Bahia. Foi esse contato que a reconectou com o frevo e a parceria continua até hoje.
Tereza foi outra que se tornou olindense pelas mãos do Homem da Meia Noite. “Ele é o dono da cidade”, afirma, e faz todo o sentido já que, em 2008, foi das mãos do boneco que ela recebeu o título de cidadã olindense, da Câmara Municipal de Olinda. “Quando ele entrou, eu caí no choro”.  
Ao longo desses anos, o calunga se fez presente até nos quadros da artista, como uma pequena assinatura, quase imperceptível, que ela faz questão de colocar nas suas obras. É um mistério que ela introduz nos seus quadros para citar a importância dessa presença na sua vida. Um mistério entre tantos outros que circundam a vida de um boneco capaz de quase transformar o Carnaval em religião, um bloco em procissão. Do topo do Sítio Histórico se enxerga um amor verdadeiro entre um boneco e uma cidade: o Homem da Meia Noite de Olinda ou a Olinda do Homem da Meia Noite.



Carnaval PE 2013 | Olinda

Mergulhe... (por Joana Pires)

O CARNAVAL EM PESSOA
Ou como um homem arrebata, à meia-noite, milhares de corações

Não há quem se recupere fácil de um amor de Carnaval. Não aquele dos beijos trocados a cada ladeira de Olinda, mas o do encontro de dois, que se torna quase epifania, momento de suspensão do que se passa ao redor. É como bater os olhos e viver uma história de amor que interrompe a vida por um momento e provoca memórias rememoradas durante anos. O impacto do amor de Carnaval é quase o de uma tatuagem feita em embriaguez, de bebida, de música, de alegria.
Em Olinda, ali perto da Rua do Bonsucesso, a caminho da Rua do Amparo, isso acontece, no mínimo, todo início de Carnaval, na madrugada em que o Sábado de Zé Pereira abre alas para o domingo da grande festa, com a saída do aguardado Homem da Meia Noite. O bloco, que carrega, sem dúvida, os foliões mais apaixonados pela cidade histórica, existe há 81 anos, mas seu impacto se faz renascer anualmente no coração de quem vê o calunga sair pela primeira vez. Porque o Homem da Meia Noite não é como um boneco gigante comum, mas uma manifestação nascida no mesmo dia de Iemanjá e carregada do mistério que as religiões africanas trouxeram para o Brasil.
Lembro que, em 2010, lá estava eu, em uma calçada do Amparo à espera do calunga, tentando dimensionar de onde vinha todo aquele amor, o que fazia todas aquelas pessoas esperarem por tantas horas, varando a noite – momento em que Olinda se torna um lugar não muito afável com os foliões, sejam eles locais ou de terras distantes. Hoje, três anos depois, percorro suas ruas em busca de uma resposta, dos depoimentos e das confissões dos amantes de longa data do boneco que se tornou a marca do nosso Carnaval.
A primeira visita que fiz foi ao ateliê de Tereza Costa Rêgo, uma das artistas plásticas pernambucanas mais consagradas. Lá, logo fui recebida por Gilda Barros Costa Rêgo, uma cadela da raça West Highland White Terrier que me fez companhia enquanto eu aguardava o momento da entrevista.
Tereza se considera namorada do Homem da Meia Noite. “Todos os anos, ela escreve uma carta declarando o amor que sente pelo calunga”, comenta Luiz Adolpho, atual presidente do bloco. “Junto com a declaração, ela sempre coloca uma quantia simbólica, uma doação, e diz: é pro meu homem tomar cerveja”, completa o presidente, quase como uma testemunha do romance.
Do sofá na sala, vejo a sombra dela refletida na parede da escada de ferro em espiral, caminhando de um lado para outro no primeiro andar, num mistério que me lembra o outro encontro que vivi no meio daquela mesma rua de Olinda. De um show no Fortim, peguei um táxi em direção ao Recife, interrompido já na Praça do Carmo por uma vontade imensa de ver o Homem da Meia Noite pela primeira vez. Dali até o calunga passar, foram quase três horas de espera, acompanhando a Cidade Alta se transformar.
De um lugar de calor, “suor e cerveja” para uma noite pesada, em que a alegria cedia espaço à vontade desmedida, à vontade de enfrentar as aventuras que vinham. Fiquei e esperei ansiosamente, como milhares de outras pessoas faziam – mulheres, homens, crianças, idosos, gente tão diferente uma da outra que só o Carnaval era capaz de juntar.
O Homem vinha, mas nunca chegava. E dali do lado da Igreja do Amparo, a gente só ouvia os fogos e via a multidão passar enlouquecida; a polícia dura; os bêbados, desatentos. Numa determinada hora, todos os comerciantes fecharam suas barracas de cerveja e espetinho, e o espaço de convivência diminuía como que anunciando a confusão. Nunca pensei que Olinda podia, ao invés de ir esvaziando com o passar do dia, ir enchendo de gente e perdendo espaço. E quanto mais noite era, mais impossível o meu objetivo se tornava.
Entre a decisão de ir embora ou ficar, fiquei, mas só decidi mesmo no momento em que vi o boneco de perto pela primeira vez. De pé na esquina da rua, eu tentava me aproximar e ver o que parecia encantar todas aquelas pessoas ali no meio da rua, paradas num empurra-empurra impossível. No muro da casa à minha diagonal direita, uma sombra refletia toda a silhueta do calunga, ajudando na preparação dos que, como eu, têm coração mole. E a sensação era de que o próprio tempo tinha dado uma paradinha em respeito à passagem daquele senhor tão distinto.
O momento em que o Homem da Meia Noite aparece no meio das ladeiras e ruas sinuosas de Olinda é, efetivamente, um momento de entendimento do Carnaval. Como se naquele pedaço de tempo, toda a loucura que a folia introduz na nossa vida tomasse corpo, fizesse certo sentido. É como se, diante do calunga, a gente encontrasse o Carnaval em corpo de boneco e entidade, o Carnaval em pessoa. Não sei se todo mundo é capaz de sentir, mas sei que quem sente nunca esquece. É como ser batizado para um rito profano.
UM HOMEM CHEIO DE AMANTES
“A saída do Homem da Meia Noite é algo diferente. O bairro todo fica em função dele, as pessoas vão buscá-lo na sede”, comenta Tereza Costa Rêgo, já sentada ao meu lado, no sofá da sua casa. O sorriso dela, vale dizer, brilha, reluzindo a paixão pelo boneco. “Eu falo isso, mas é isso que eu sinto de verdade: ele é meu namorado”, conta entre risadas.
O romance dos dois começou em 1979, momento em que Tereza voltava ao Brasil após ter sido exilada por conta da ditadura. Era o ano da anistia política e ela retornava ao País com o marido, Diógenes Arruda. Os dois eram membros do PC do B e voltavam da França quando, na chegada em São Paulo, Diógenes sofreu um enfarte fulminante e faleceu na saída do aeroporto.
“Este foi o momento de uma tristeza profunda e, vindo pra Pernambuco, me instalei em Olinda, nessa mesma casa em que vivo hoje. A casa era um vão, não tinha janela, não tinha nada. Mas de lá de dentro ouvi os clarins anunciando a passagem de um bloco. Corri para a calçada e quando abri a porta, dei de cara com o Homem da Meia Noite, sorrindo na minha frente”, comenta. “Nessa hora pensei: perdi o marido, mas achei um namorado”.
Ela sabe, na verdade, que não é a única namorada do calunga. Ao longo desses mais de 80 anos, o Homem da Meia Noite já colecionou muitas paixões. Até seu nascimento, dizem por aí, tem ligação com as conquistas amorosas de um homem galante. Conta Seu Neo e Dona Irene, filhos de Benedito Bernadino, um dos fundadores do bloco, que a inspiração para a sua criação veio justamente de seu pai, que via, todos os sábados, um homem misterioso, elegante, carregando chapéu e vestindo casaca, passar à meia-noite seguindo sempre o mesmo caminho. Certo dia, Seu Benedito, curioso, resolveu segui-lo e constatou que o homem era um “Don Juan”, que pulava janelas de sobrados e conquistava as donzelas de Olinda. Não se sabe até hoje se a história é real, mas não há quem duvide ao ver, nos sábados de Carnaval, a casa verde de Seu Neo e Dona Irene apinhada de tanta gente apaixonada, aguardando com ansiedade a saída do boneco.
Dona Elma, que mora em outra casa verde a três casas da sede do bloco, conta da paixão do pai, Seu Isná de Luna, outro integrante do grupo de fundadores. “Ele amava o bloco. Passou um período em que o boneco saía da sede e já seguia pra Olinda, sem vir por esse lado de casa. Meu pai chorava, entristecido”, conta Dona Elma, com as mãos trêmulas de emoção. Hoje com 70 anos, ela lembra com carinho dos anos que viu o pai dedicar ao Homem da Meia Noite. “Durante o ano todo, a gente só saía se fosse com ele, sozinha não podia. Mas no Carnaval, ele deixava a gente sair com mãe e brincar sem problema”. Era o momento de permissão da felicidade.
Nascida e criada na mesma casa da Rua do Bonsucesso, hoje ela acha que o bloco tem se tornado difícil de ver. “A multidão é muito grande e pra ver tenho que enfrentar a calçada, mas nunca deixei de brincar”, comenta. “Eu amo o Homem da Meia Noite”.
“É um bloco difícil, porque é uma explosão de gente. Já passei pela sensação de ser esmagada na parede pela multidão que o acompanha”, conta a artista plástica Isa do Amparo, outra vizinha da sede do bloco. “Ainda pesquiso qual o elo de energia que faz o povo subir a ladeira para ver esse homem”, comenta.
Ela, que é baiana, mas já vive em Olinda há 32 anos, lembra que se mudou para a Cidade Alta numa sexta de Carnaval. “Mudei para essa casa ainda em obras, minha mobília ia passando junto com o Elefantes [o bloco]”. Desde então, Isa é apaixonada pela festa de Olinda e construiu uma “relação íntima” com o calunga. “Até roupa pra ele eu ajudei a fazer”, conta orgulhosa.
Ela, como Tereza, foi homenageada pelo bloco em 2012, na comemoração dos 80 anos do calunga. “Isso pra mim foi como uma confirmação de que eu sou olindense”. Isa veio para Olinda também de mãos dadas com um grande amor, um artista plástico pernambucano que ela conheceu numa Bienal de Arte da Bahia. Foi esse contato que a reconectou com o frevo e a parceria continua até hoje.
Tereza foi outra que se tornou olindense pelas mãos do Homem da Meia Noite. “Ele é o dono da cidade”, afirma, e faz todo o sentido já que, em 2008, foi das mãos do boneco que ela recebeu o título de cidadã olindense, da Câmara Municipal de Olinda. “Quando ele entrou, eu caí no choro”.
Ao longo desses anos, o calunga se fez presente até nos quadros da artista, como uma pequena assinatura, quase imperceptível, que ela faz questão de colocar nas suas obras. É um mistério que ela introduz nos seus quadros para citar a importância dessa presença na sua vida. Um mistério entre tantos outros que circundam a vida de um boneco capaz de quase transformar o Carnaval em religião, um bloco em procissão. Do topo do Sítio Histórico se enxerga um amor verdadeiro entre um boneco e uma cidade: o Homem da Meia Noite de Olinda ou a Olinda do Homem da Meia Noite.

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