segunda-feira, 23 de dezembro de 2013

                                                           Pastoril do velho Dengoso


                      PASTORIL PROFANO

O Pastoril do Velho Dengoso,que faz parte da agenda cultural do ciclo natalino do Recife,e um exemplo, dos raros pastoris desta modalidade,que sobreviveu ao tempo.Ate o final da decada de 80,os pastoris profanos resistiam ao lugar comum que era o ciclo natalino,e faziam apresentacoes de casa cheia  nos circos(tomara que nao chova) armados nos suburbios da regiao metrolitana do Recife. Este tipo  de entretenimento da arte circense desapareceu  da periferia e com ele as agendas e muito dos pastoris profano de pernambuco.  O pastoril tem cor e sonoridade do ciclo natalino ,as criancas,o azul,o encarnado,as musicas  e a Diana.  Ao enveredar por outros caminhos, o Auto Pastoril transforma-se em sincretismo profano-religioso, tornando-se, muitas vezes, em profano, com suas características que ressaltam a licenciosidade do Velho do Pastoril e a sensualidade das Pastoras.

No Recife, por volta de 1840, começaram a aparecer sociedades com o fim de dirigir com solenidade, brilhantismo e decência o natalício do Messias, por meio de representações teatrais, tais como a Sociedade Natalense e a Sociedade Nova Pastoril, conforme registra Pereira da Costa. Com a formação dessas sociedades, os pastoris passaram a ter uma forma literária, de modo que transformavam-se em espetáculos, contando com poetas, escritores e artistas que criavam letras e músicas. Dentre tantos que contribuíram nesse período, há que se destacar os irmãos Valença - João e Raul que apresentavam, quase todos os anos, um Presépio, assemelhado com os autos hieráticos oitocentistas. Ascenso Ferreira revela que, no Recife, o avô de João e Raul Valença encenou, pela primeira vez, um Presépio em 1865, no auge da Guerra do Paraguai. A tradição foi mantida até 1900 pelo pai dos dois irmãos compositores já citados, que após alguns anos de interrupção, assumiram a volta ao tablado do Presépio, no Sítio Valença, localizado entre a Madalena e o Zumbi, com as mesmas características de auto sacramental. Os personagens utilizados pelos irmãos Valença eram: Culpa, Libertina, Religião, Graça, Gabriel, Pastoras, Lusbel, Mestra, Diana, Contra-mestra, Eva, Argemiro, Monge, Flora, Herodes, Centurião e Cingo. 



PASTORAS DO ESPETÁCULO "MANGABA COM CATUABA".Banco de Imagem /JC

Fica claro também que, enquanto as sociedades tentavam manter um controle moral e religioso, evitando enxertos de cenas burlescas e licenciosas, os Pastoris ditos profanos abundavam nas pontas de ruas, alterados em suas formas originais, contando com a participação dos espectadores na animação das cenas, fugindo do enredo e da temática e, como diziam os mais arredios, irreverentes, licenciosos e imorais.

Os esforços das sociedades para manterem a seriedade do ato sagrado que se pretendia reproduzir, repercutia também na imprensa: os jornais da época censuravam o ar indecente de que se revestiam certos presépios, com opiniões que indicavam que a Polícia devia impedir as apresentações, no zelo pela moral pública e pelos bons costumes. Há registros, de 1840, dessas denúncias, por exemplo, no jornal O Carapuceiro, do Frei Miguel do Sacramento Lopes Gama, conhecido como o Padre Carapuceiro e por suas críticas de costumes na primeira metade do século XIX. 

É certo que o Pastoril teve seu grande momento nos primeiros vinte e cinco anos desse século, sendo representado por iniciativa de leigos mas sem perder sua ligação com festas religiosas, principalmente, como já foi dito, do Ciclo Natalino. Por outro lado, os Presépios sempre foram encenados por jovens e meninas de família, que paramentadas de pastoras angariavam prendas, como flores, bolos, perfumes, frutas, que se transformavam em prêmios dos leilões realizados em benefícios de instituições religiosas ou obras de caridade.
A partir de então os pastoris se espalharam pelos bairros atraindo sempre um público certo e participativo e, evidentemente que, com mais licenciosidade, atraíam os homens. Dentro da estrutura do auto, as pastoras com seus pandeiros ou maracás, cantam e dançam ao som da orquestra de pau e corda mas sua formação dependia dos recursos financeiros do grupo. Algumas traziam pistão, trombone, clarinete, bombo. Outras se apresentavam com violões, cavaquinhos, com um instrumento de sopro solista.









VELHO XAVECO. Jaime Fotografia

No meio dos dois cordões, cada um comandado pela Mestra (cordão azul) e Contramestra (cordão encarnado), encontramos a Diana, vestida metade azul, metade encarnado. O Velho, conhecido como Bedegueba, mas que toma diversos apelidos é uma espécie de bufão, de palhaço de circo, que comanda as jornadas (cantos das pastoras) e se esparrama em piadas, numa atuação que ressalta o histrionismo, a improvisação. Seus diálogos com as pastoras são cheios de duplo sentido e, com o público, puxa discussão, brincadeiras, faz trejeitos e canta canções adaptadas às suas necessidades.Dentre os outros personagens do pastoril profano, também desfilavam o Anjo a Estrela do Norte, o Cruzeiro do Sul, a Cigana, além de outras figuras que aparecem ocasionalmente por influência do local, da região.
Hoje o pastoril perdeu em sentido hierático e lírico, mas transformou-se num gênero popular de representação, diferenciado e que atingiu sua própria forma. Não é questão de involução mas de interferência dos artistas populares que com os seus espíritos inquietos e brincantes conduzem esses folguedos.

É importante salientar que as canções dançadas sucediam-se uma após a outra, sem qualquer diálogo ou texto de ligação entre eles, a não ser quando o velho do pastoril interferia com suas improvisações para estimular o público e receber gorjetas para lançar, com deboche, suas irreverências.

Como espetáculo popular, o pastoril perdeu muito de sua popularidade, e hoje encontramos poucos grupos que ainda animam os bairros nos tablados armados na praça, ou como dizem: "não há mais pastoril de ponta-de-rua", com sua alegria irreverente. E naturalmente, perdeu sua função social. E perdemos verdadeiros atores mambembes, sendo justo lembrar os grandes velhos de pastoris, tais como: Amaro Canela de Aço, Catota, Galo Velho, Cebola, Baú, Velho Barroso, Futrica e o Faceta.
Mas, ainda que os fenômenos econômicos e sociais tenham interferido para a decadência dos pastoris, é bom lembrar a resistência do Velho Xaveco e Suas Pastoras, lançando discos e realizando espetáculos em teatros ou a recriação do ator Walmir Chagas, com o seu Velho Mangaba.

Nenhum comentário:

Postar um comentário