sábado, 13 de fevereiro de 2010


















CABOCLINHOS CAHETÉS - RITMO, CORES E COREOGRAFIA
Flauta de taquara, percussão e maracás. Quatro caboclos sobem ao palco, estão aparentemente sós. A multidão, expectante, tem olhos só para eles. Usam cocares, penas na cintura, nas pernas, braços, o pescoço cingido por colares de sementes; são o abre-alas da tribo que ficara para trás. A flauta dispara o ritmo “na guerra”, sincopado, ligeiro. A percussão acompanha, os maracás chiantes dão o equilíbrio. Vêm o porta-estandarte, o cacique, a mãe-da-tribo, o pajé, o matruá, capitão, tenente, perós (meninos e meninas), caboclos-de-baque, cordão de caboclos, de caboclas. O tocador de flauta, a inúbia, em geral um moço quase imberbe, hábil nos dedos; o instrumento é pouco maior que o palmo de sua mão, o som é telúrico, elétrico. Na rua do Sol, vizinha ao cemitério de Goiana-PE, a tribo de Caboclinhos Cahetés com aproximadamente 120 caboclos, marca a fundação da Associação dos Caboclinhos de Goiana. Em frente ao palco, o cortejo faz a primeira evolução; duas filas paralelas de caboclos voltam pelo interior do bloco, formando quatro filas. Os músicos mudam o ritmo para o “perré”, sincopado e lento, uma trégua. Os perós, cada um empunhando arco e flecha, dispara-os para cima e para baixo; o som do impacto da flecha no arco enriquece a percussão. A terceira variação de ritmo é o “baião”, mas só “na guerra” o delírio é recuperado. Os pés, na coreografia ligeira, não se deixam flagrar pelos flashes das câmaras. Os Caboclinhos Cahetés surgiram em 1904. Criados pelo cortador de cana, João de Melo Marinho, filho de escravos, então casado com uma índia. Conforme o pedreiro Pedro Gonçalves Ramos, sobrinho-bisneto de Marinho, o folguedo celebrava “a caça e a colheita, misturando ritmos;” ritmos festivos e animosos. “Hoje a caça é proibida. Na terça-feira de carnaval, o bodeiro mata um bode para a festa. À tarde, os caboclinhos vão para o desfile no Recife”, completa Ramos. Ele tem 63 anos, há trinta e seis é presidente dos Cahetés; está obeso, não pode mais desfilar. Por ser o mais antigo dos mestres, foi eleito presidente da Associação dos Caboclinhos de Goiana; lidera, além dos Cahetés, os 7 Flechas, Tupinambá, Potiguares, Tapuia Canidé. Canidé – base da dissidência do Tapuia -, Carijós, Caripó, Iraguara e Tabajaras. A sede da associação, também Ponto de Cultura com apoio da Fundarpe, foi construída por Marinho. Pedro Gonçalves Ramos é viúvo e mora com duas filhas e um filho, no pavimento de cima. O Ponto tem dois computadores, uma sala para reuniões. O filho, Pedro Júnior, tem 24 anos, opera o equipamento e diz-se “multimídia.” Nos fundos, há uma escola para crianças, herdada da falecida e gerida pelas duas filhas, ambas caboclinhas. Os estatutos dos Cahetés proíbem a venda da sede. “Há três anos, meu sobrinho vendeu a sede. O caso foi para a justiça. O juiz anulou a venda, mesmo o comprador já tendo pago 10 mil reais”, diz o presidente. Por ser do “grupo especial”, Cahetés recebe cachê da Fundarpe, para o desfile na capital e em cidades da Zona da Mata; afora o da Prefeitura do Recife – 12 mil reais pagos em duas parcelas. O mestre-de-cerimônias da apresentação dos caboclinhos foi o brincante Sérgio da Burra, um brincante de 28 anos, há dez no ofício. Todos os anos, no carnaval, veste-se de lantejoulas, chapéu dourado e monta uma burra de papelão tão brilhante quanto ele. Fuma cachimbo, é âncora de programa radiofônico – Canavial - na rádio comunitária local, tocando ritmos de maracatus e indígenas.
William Veras de Queiroz, 2010-D.C- Santo Antônio do Salgueiro-Pernambuco

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