Mestra Anézia é considerada uma lenda de Santa Luzia do Norte
Se tem uma personalidade que encarna fielmente a honraria de ser um Registro do Patrimônio Vivo das Alagoas, essa pessoa se chama Anézia Maria da Conceição,que nasceu no dia 5 de maio de 1909,no povoado Apolonia,municipio de Satuba,estado de Alagoas. Do alto dos inacreditáveis 109 anos de idade, já é considerada uma lenda no mais populoso bairro da pequena cidade de Santa Luzia do Norte, a 63 km de Maceió.
O Registro do Patrimônio Vivo é uma iniciativa do governo de Alagoas, por meio da Secretaria de Estado da Cultura (Secult), destinado ao reconhecimento da produção, preservação de aspectos da cultura tradicional ou popular que atue nas áreas das danças, folguedos, literatura oral, escrita, gastronomia, música, teatro e artesanato, entre outras.
Mesmo sem enxergar e andar, mas absolutamente lúcida e de bom-humor, dona Anézia é a rezadeira mais famosa e a primeira parteira de Santa Luzia do Norte. “A grande maioria do povo acima dos 30 anos aqui do bairro do Quilombo nasceu pelas mãos de mamãe”, atesta a filha da mestra, Maria Anunciada Silvestre.
A mestra Anézia é reverenciada como autoridade no bairro Quilombo, o mais popular da cidade. “Sempre que alguém precisa de alguma oração ou reza,” procura a mamãe”, completa Anunciada.
Com sua simplicidade e sob olhar atento de todos, a mestra vive quase sempre cercada pelo carinho da filha, dos 30 netos, dos 51 bisnetos e dos moradores que visitam a benzedeira em busca de suas palavras de fé.
Católica fervorosa, essa mulher centenária nascida no Engenho da Passagem, na cidade de Atalaia, tem sempre à mão seu inseparável rosário e, na boca, palavras de amor e conforto.
Nossa Senhora do Rosário, Nossa Senhora do Livramento, Nossa Senhora do Desterro e, claro, Santa Luzia, fazem parte constante de seu rito a qualquer cristão que queira uma reza para amenizar as agruras da vida. “Deus me mandou ao mundo lá no Engenho da Passagem, em Atalaia, meu filho!”, relembra.
Para a cura, utiliza plantas como peão roxo, vassourinha e jurema. O ritual quase sempre é aberto com um “rosário apressado”, em que balbucia dizeres, em um mistério que só ela e Deus podem decifrar. “Isso é muita fé e tradição, meu filho!”, explica dona Anézia.
A parteira
A mestra Anézia conta como sua intuição atuava, quando alguma mulher estava para “descansar” (dar à luz). “Olhe, meu filho, eu sempre era avisada em sonho”, conta a agora ex-parteira, que deixou esse ofício há mais de 25 anos e se dedica agora somente à reza.
A mais fiel herdeira da cultura dos quilombolas e das heranças vindas da Mãe África na cidade, mulher conhecida por rezar para quebranto e ventre caído, entre outros males, completou 109 anos no dia 5 de maio.
Seu trabalho como rezadeira se iniciou quando tinha apenas 10 anos. “Via meu pai rezar e achava bonito”, relata a descendente de escravos.
Sobre a missão de ajudar as mulheres a “descansar”, ela diz que tinha apenas 15 anos, ao observar o trabalho de uma senhora. A primeira experiência foi quando uma gestante não teve tempo de chamar uma parteira e ela mesma deu conta do recado e fez seu primeiro parto com orientação da própria gestante. “Quando o marido chegou com a parteira, o bebê já estava limpo e nos braços da mãe. A partir daí, ela não deixou mais de fazer partos”, comenta a filha, Anunciada. “Graças a Deus, nunca deu complicações nos partos que fiz. Nunca ninguém morreu na minha mão”, afirma, feliz, a mestra Anézia da Conceição.
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